sábado, 26 de março de 2016

Alguém Para Perdoar - Capítulo 1

Após tantos meses de espera, chega a hora de começarmos as postagens de Alguém Para Perdoar. A sequência de Alguém Para Amar começa agora. Por que demorou tanto? Bom, a promessa sempre foi começar as postagens em março. Mas planejávamos que fosse lá no início do mês, assim que Alguém Para Amar fosse colocada na Amazon. Porém, a revisora do livro atrasou prazos, muito, tanto que tivemos de trocar de revisora e só teremos o primeiro livro revisado em abril. Ficamos MUITO chateadas. E diante desses problemas tivemos bloqueio criativo. É chato escrever a sequência enquanto nosso primeiro livro fica trancado por uma profissional ruim. Ainda assim, começamos a postar agora e esperamos que gostem. Não estamos com muitos caps prontos então peço paciência caso não haja postagem em algum final de semana.
Aproveito para convidá-las a ler nossos outros livros. Vida Roubada / Ariella estão sendo postados e muitos outros estão concluídos. Bjs e lá vamos nós.




O caminho que Nathan acreditava jamais tornar a fazer foi cumprido em muitas horas de viagem. De Milão até Bento Gonçalves, passando por São Paulo e Porto Alegre. Viagem longa, cansativa e feita com o coração pesado de lembranças e arrependimentos. Quatro anos atrás, após um período curto, porém de grande felicidade, ele deixou na Serra Gaúcha uma história inacabada que até hoje lhe fazia falta. Chegara a hora de recomeçar.
            Há quatro anos conheceu Milena Vicentin, fundou um restaurante e deu início uma vida paralela. Mas tudo desmoronou quando percebeu que vidas paralelas não existiam. Teria de escolher uma ou outra. Escolheu com a cabeça, não o coração. E após deixar o Brasil, pouco fez por seu restaurante. Por isso, sabia ter uma dívida pesada de carregar para com Emily Fruett, sua amiga e sócia. Quando a convidou para abrir um restaurante em parceria, deixou claro que seguiria vivendo em Milão. Mas não lhe falou que passaria quatro anos sem colocar os pés no investimento. Fora a sócia a cuidar de tudo, resolver cada dificuldade e atualizá-lo do que se passava. Por toda a sua dedicação, Emily foi financeiramente recompensada. Ainda assim, ele se sentia em falta com ela.
            A vida, porém, tomou rumos jamais pensados. Lhe tomou as poucas certezas obtidas e apresentou novas possibilidades. Olhando sua vida agora, ela lhe parecia como uma folha em branco. E, ao mesmo tempo que vislumbrava nela a possibilidade de escrever o que bem desejasse, também via retratado o vazio em que se encontrava. Há quatro anos, quando conheceu o sul do Brasil, tinha em sua vida três compromissos que o prendiam a Milão. O primeiro era o seu restaurante e renome como chefe de cozinha em toda a Itália. Depois sua vida boêmia e livre. E, em terceiro, suas responsabilidades para com a esposa, em estado vegetativo há tantos anos. Apesar de tudo, dar uma vida digna a Valentina era sua obrigação.
            Conhecer Milena Vicentin, cunhada de Emily, foi uma alegria. De sorriso puro e voz doce, cruzar com Milena foi como encontrar um anjo que o fez ser feliz como não ocorria há muito tempo. Foram alguns encontros em poucas semanas, mas mudaram sua vida e a forma de encarar o mundo. Mas tudo mentindo e enganando-a. Quando revelou ser casado precisou afastar-se. Envolver-se com Milena foi um risco grande demais. Ainda assim, deixou o Brasil sem saber como faria para desfazer-se de todos aqueles sentimentos.



            Enfim chegara a hora de voltar. E após dirigir em meio aos infinitos parreirais cruzou a porteira de madeira nobre entalhada que anunciava serem aquelas as terras dos Vicentin. Quando esteve ali pela primeira vez, disse a todos ter se encantado pelos vinhos. Eram realmente maravilhosos. Mas nunca foram eles a atraí-o. Ainda assim, seriam a desculpa utilizada novamente. Veio ali para adquirir lotes de vinhos.

            - Buongiorno. – Disse ao primeiro homem que avistou no caminho. Depois lembrou-se de falar português. Apesar de parecer-se muito, não estava na Itália. – Eu vim ver alguns vinhos. Os proprietários da vinícola estão?
            - Estão sim. Hoje está todo mundo aí. Mas não marcaram nenhuma visitação. – Era sábado a tarde e o funcionário sabia muito bem que negócios não seriam firmados. Era um sábado de festa familiar. – É melhor voltar outro dia.
            - Não posso. Eu já esperei tempo demais pra rever essa terra. Pode ligar e avisar para Milena que Nathan Johnson está indo encontrá-la na casa.

            Guilherme, o funcionário da Vinícola, ligou para avisar. Mas não a Milena, já que ela apesar de ser uma Vicentin não era responsável pela venda de vinhos e também porque naquele dia ela não estava ali a trabalho, como fez questão de dizer logo pela manhã ao chegar.
            Quando aproximou-se da casa da família Nathan teve uma surpresa. Imaginou se deparar com Milena lhe recepcionando com um sorriso, meio que desconfiado, mas feliz em tê-lo ali. Porém, numa área mais afastada e sob um toldo viu muitas pessoas reunidas e na frente da casa quem veio recepcioná-lo foi Lorenzo Vicentin. Sabia ser ele o administrador da vinícola, mas, até onde lembrava-se, ele havia se casado e morava em São Paulo agora. O mesmo ocorria com o seu irmão e também proprietário das terras, Jonas, casado com Emily e administrador também de uma construtora civil, ele não passava mais do que um final de semana por mês no Rio Grande do Sul. Quem vivia ali e tocava o dia a dia do negócio era Milena ao lado dos pais e avós. Foi quase impossível para Nathan disfarçar a decepção em ver Lorenzo.

            - Nathan. Pensei que Guilherme havia se enganado quando ligou. Você veio de Milão comprar vinhos aqui? Em um sábado à tarde?



            Essa desculpa serviria bem para enganar os pais de Lorenzo. Até porque, ele vinha negociando por e-mail com o administrador a aquisição dos lotes e realmente precisaria vir assinar o contrato. Só não havia avisado quando. E por isso Lorenzo o encarava com surpresa.

            - Decidi vir passar alguns dias no Brasil. Mais tempo em São Paulo, é claro. O Calderone, meu restaurante em parceria com Emily é... o principal foco da minha viagem. – Mentiu. – Mas preferi começar pelas obrigações pelo sul. Lá em Milão estão ansiosos pelos vinhos Vicentin. Espero não estar atrapalhando nada.
            - Não...apenas uma festa familiar. Estão todos aí, Emily vai adorar sua visita. Pelo que ela me disse, faz algum tempo que você não aparece.
            - É verdade, bastante tempo. – E ele não esperava encontrá-la ali. – Qual a razão da festa?
            - É aniversário da filha de minha irmã. – Lorenzo afirmou e Nathan perdeu o chão.
           
            O tempo pareceu parar naquele exato instante. Aquilo era tudo o que Nathan não esperava ouvir. Não que tivesse esperança de alguém bela e agradável como Milena tivesse ficado à sua espera nesses quase quatro anos de ausência. Mas lhe soava como uma rasteira do destino ela ter formado uma família justamente quando ele tornou-se livre para reencontrá-la.



            Poderia ter mantido contato com Milena. Não o fez porque não viu futuro a eles. Seria injusto dizer-lhe para esperá-lo eternamente enquanto ele seguia casaco com Valentina. Mas então, após uma década sem falar, andar ou sequer abrir os olhos, o coração de Valentina enfim desistiu de seguir batendo. E ao saber da notícia Nathan não soube quais sentimentos prevaleceram.
            Viu aquela bela mulher com quem se casou destruir sua vida com drogas cada vez mais fortes. Até que não houve mais como reverter o caminho e, após uma parada cardiorrespiratória, a vida de Valentina soou a todos como um castigo e não uma benção. Dependente para tudo e sem nenhuma perspectiva de melhora, Valentina definhou aos poucos e se, apesar de tratar-se desde o início de um casamento por interesse e não por sentimentos que os uniam, em algum momento ele teve esperança de ser feliz ao seu lado, isso logo terminou. Desde que o laudo médico informou que Valentina poderia viver muitos anos, mas sem nenhuma perspectiva de melhora, ele também sentiu-se um pouco morto. Estava amarrado nela e dele dependia seu bem estar, mesmo que aos olhos de todos nada que fizesse fosse bom o bastante.
            De que adiantava pagar pelos melhores médicos e enfermeiras se Valentina jamais melhoraria? De que servia manter seu corpo bem cuidado quando ela nunca deixaria a cama? Aquela era uma tristeza que não sarava e, aos poucos, Nathan afastou-se da esposa. A casa que dividiam mais parecia um hospital. Tinha o cheiro dos remédios e agora mais profissionais da saúde vestindo branco do que funcionários. Ele passou a ter ódio daquele lugar. Por algum tempo chegou a odiar a Itália e todas as suas revistas de fofocas que lucraram com a tragédia nas vidas dele e de Valentina.
            Nathan não tinha família na Itália. Apenas um avô e alguns tios que há muito não via e viviam nos EUA. Seu pai, americano, e a mãe, italiana, morreram quando ele tinha 19 anos e deixaram o filho único bem encaminhado na vida e sem irmãos. Ele escolheu viver na Itália justamente por preferir não ter família com quem conviver. Considerava melhor assim. Casou-se com Valentina porque ela também era uma herdeira sozinha no mundo. A companhia dela lhe agradava, eram amigos e não cobravam um ao outro. E a união encobria outros relacionamentos dele e dela, sem que a imprensa descobrisse. Teriam tido paz das páginas de revistas se ela não tivesse se deixado afundar pelas drogas. Ela não teve de lidar com o assédio e os intermináveis pedidos de entrevistas sobre o caso. Ele sim. E não foi fácil.
            Depois superou e aprendeu a sobreviver em meio a tudo aquilo. Primeiro deixou a casa e passou a viver um apartamento solitário. Depois descobriu formas de encontrar sexo e companhia sem chamar a atenção da imprensa. Dedicou-se ao seu restaurante e também a produção de um livro de culinária que fez muito sucesso. As mulheres pareciam encantar-se por homens que sabiam cozinhar. Assim passaram-se os primeiros 10 anos de ‘quase morte’ de Valentina. Ele sentia-se livre, porém, sabia seguir amarrado nela.
            Nada disso servia de desculpa para o que fez a Milena. Ela não merecia ser abandonada daquela forma e ele ainda ressentia-se da própria atitude. Foi embora prometendo jamais voltar e, ainda assim, nunca a esqueceu. Há três meses tudo começou a mudar. Estava atarefado no restaurante quando lhe telefonaram de sua casa informando que sem nenhuma razão aparente o coração de Valentina parou de bater. Era hora dele recomeçar a viver e só o rosto de Milena aparecia à sua frente como um convite a felicidade. Fez a compra dos vinhos, programou sua viagem e chegou ali cheio de expectativa. E desmoronou frente ao comentário de Lorenzo.

            - A filha de Milena faz aniversário hoje? – Parecia tão duro aceitar que a vida dela seguiu e, agora, quando finalmente ele era livre, ela estava comprometida. – Desculpe. Eu...não quis atrapalhar. Eu vou embora...
            - Não. Claro que não. Eu vou pegar o contrato e, enquanto isso, por que não se junta aos convidados na festa? Tenho certeza que irá gostar.




            Protegidos por uma grande estrutura de ferro e lona, muitos adultos conversavam e crianças corriam. Nathan não demorou a reconhecer muitos rostos ali presentes. Mas não se deu ao trabalho de ir cumprimentar ninguém. Procurou Milena com os olhos por cada canto. Precisava vê-la com o marido e a filha. Saber se era feliz e se ele realmente nada tinha a fazer naquela vinícola. Se fosse assim, a deixaria seguir com a vida sem interferir em nada. Não era correto tornar a bagunçar sua vida quando ela lhe ofereceu tudo e ele disse não.
            Quando a viu seu coração pareceu se iluminar. Milena sorria abraçada à menina, muito pequena e tão parecida com ela. A mesma cor nos cabelos e nos olhos. O mesmo sorriso largo no rosto. Sim, elas eram felizes e ele teria de aceitar que outro homem soube aproveitar melhor a oportunidade que a vida lhe deu.

            - Nathan! O que faz aqui? – Foi a voz de Emily a tirá-lo daquela paralisia.
           
            Emily conhecia Nathan há tempo o suficiente para saber que ele olhava-a tentando formular um raciocínio. Ela desconfiava, há muito tempo, que ele teve um motivo muito especial para deixar o Brasil daquela estranha forma. Por algum tempo acreditou que ele voltaria a Bento Gonçalves. Mas com o passar dos anos ela deixou de acreditar que isso ocorreria e, talvez, até duvidou das próprias desconfianças. Agora tudo se reavivava.



            - Fale, Nathan! – Emily insistiu. – O que o fez vir aqui após quatro anos sem nem aparecer em São Paulo para vistoriar o Calderone?
            - Confio em você demais para precisar fazer vistorias, Emily. É uma grande chefe e empresária. Sei que meu empreendimento está nas melhores mãos.
            - Pode ser. Mas elogios não respondem minha pergunta. Obviamente, você não veio curtir a Serra Gaúcha pelo final de semana.
            - É claro que não! – Nathan não gostava de ser pressionado. – Você sabe que meu restaurante em Milão vai muito bem e que os vinhos Vicentin fizeram muito sucesso por lá. Há tempos venho negociando com Lorenzo a entrega de novos lotes e vim cuidar dos contratos. Pretendia lhe fazer uma surpresa e segunda-feira encontrá-la no Carderone. Mas fui eu a ser surpreendido.
            - É, percebi. – Emily ainda não estava convencida. – Quer se sentar conosco?
            - Sim, claro. Lorenzo foi pegar o contrato. Espero que não demore.
            - Imagino que todas essas crianças por perto lhe irritem.
            - Não diga isso. Não sou pai, mas também não as abomino. – Nathan esclareceu. – E os seus? Como estão?

            Emily enfim sorriu. Esse assunto sempre fazia seu coração se alegrar.

            - Lindos. Vida já tem cinco anos e está na pré-escola. Fala pelos cotovelos em português e italiano. E Bernardo tem quase quatro e é o menino mais maravilhoso do mundo, aos meus olhos um tanto comprometidos nesse julgamento, é claro.
           
            Antes de ir sentar-se com a amiga e sócia junto dos Vicentin, Nathan disse que precisava ir ao banheiro. Queria na verdade ficar observando Milena e a menina. Pareciam tão perfeitas juntas. Mas quando enfim encontrou-as novamente, Nathan percebeu algo diferente. Elas conversavam agilmente, mas não com a voz e sim por gestos. Era tão rápido que Nathan não conseguia nem tentar acompanhar.
            Sem resistir, ele se aproximou das duas. A menina o viu primeiro e desconcentrou-se dos sinais feitos pela mãe. Foi isso que fez Milena virar-se para olhá-lo. A alegria sumiu de seus olhos naquele instante. Antes que Nathan tivesse a chance de falar qualquer coisa ou perguntar da menina, ele viu Milena voltar-se a filha novamente e fazer alguns gestos. Logo depois a pequena saiu correndo pelo salão, desviando de pessoas e cadeiras. Nathan viu Milena erguer-se do chão e abrir a boca para lhe dizer algo. Ele não esperava por tamanho ressentimento.

            - Saia daqui. E não se aproxime da minha família. – Milena disse sem erguer a voz. Logo depois deu-lhe as costas e saiu caminhando pela festa.


            Todos sorriam e pareciam felizes. Menos Nathan. E naquele momento ele sentiu-se ainda mais excluído.

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