sábado, 9 de janeiro de 2016

Vida Roubada - Cap 11


            Nos dias que seguiram ao explosivo encontro com Sebastian, Beatriz viveu a dura sensação da incerteza. Ele poderia aparecer a qualquer momento, ou nunca mais. E se colocasse os pés na boate novamente poderia ser para passar a noite com outra. Essa possibilidade existia, porém, não lhe assustava. Algo despertava a confiança de que Sebastian não teria olhos para outra.
            Trabalhou nas noites seguintes suportando não apenas os clientes, mas, principalmente, as investidas de Gregory. Muito pior do que aturar os homens que pagavam por sexo era ter de suportar ser tocada por ele nos corredores ou aceitar seus abusos quando Samantha não estava por perto. As ameaças de Sebastian pareciam ser reais. Ele não mais foi violento. Parecia temer deixar alguma marca em seu corpo e despertar o ódio do americano. Mas isso não o impedia de chamá-la à sua sala sempre que a esposa saía e exigir para si o que costumava vender aos clientes.



            - Você não deve ser gélida assim com os outros. Ou não teria nenhum cliente a desejando. Vamos potranca...mexa esses quadris como faz com Sebastian. Quero a paixão com que você o enlouqueceu. – Ele lhe disse certa tarde quando irritou-se com sua passividade.

            Aquela foi a primeira vez em dias que ela ouviu o nome de Sebastian. E mesmo com Gregory intimamente ligado ao seu corpo, não pode perder a oportunidade de saber dele.

            - Talvez eu não o tenha enlouquecido tanto. Ou não teria desaparecido. – Provocou para tentar alguma resposta.
            - Ele é um homem ocupado. O que você esperava? Um amante 24? Esqueça. Sebastian aparece e desaparece conforme deseja. Uma noite dessas aparecerá querendo ou outra. – Ele então penetrou-a com mais força, querendo machucar. – Agora faça a única coisa para que serve antes que eu perca a paciência.

            Gregory teve apenas alguns minutos para se recuperar do encontro às escondidas com Beatriz antes da chegada de Samantha. Aquilo não o irritava, ao contrária, julgava divertido. Um tipo de tempero para as saídas com a prostituta e também o relacionamento com a esposa. Samantha é que não consideraria nada interessante caso soubesse que ele transava com Bia quando desejava. Ela se sentia ameaçada pela garota imposta na boate por Gabriela. Talvez porque logo no início ele tenha cometido o erro de permitir que Samantha soubesse que Bia não é como as outras. A classe, refino e beleza de Beatriz intimidavam Samantha.             Desnecessariamente, é claro. A desejava, tinha tesão por ela, mas logo após se satisfazer nela a liberava para ir deitar-se com outro homem sem sentir nenhum remorso. Com Samantha não. Há anos quando começou a se envolver com a negra linda, esguia e com curvas nos lugares certos, Samantha também se prostituía. Ela fazia sucesso entre os homens e logo ele resolveu provar dela. Entendeu que Samantha realmente tinha algo de especial e a comprou para si. Não exatamente por amor. Simplesmente não conseguia lidar com a sensação de estar repartindo o que é seu. Desde aquele momento Samantha tornou-se sua assistente nos negócios e dona de seus desejos. Podia desejar uma ou outra ocasionalmente, mas nenhuma se comparava a Samantha. E o fato de Beatriz falar bem, ter uma bela postura e estar atraindo um ricaço, não o fazia cogitar trocar de companheira. Ainda assim, podia se beneficiar com aquele ciúme.
            Samantha sempre se orgulhou do faro apurado. Desde os tempos de prostituta de rua, conseguia sentir o cheiro da encrenca quando ela se aproximava. Isso, no entanto, não a impediu de ser sequestrada e levada para aquela boate como escrava. Assim permaneceu até Gregory chegar, há alguns anos. Desde que ele passou a chefiar o lugar, não tirou os olhos dela. Algumas transas depois e começou a ganhar alguns agrados dele. Até que usou das artimanhas que só uma mulher conhece para arrancar o que desejava de seu homem. Passou a usar os clientes para fazer ciúme. Até que Gregory caiu na armadilha e a exigiu só para si. Saiu de presa para carcereira e,apesar de lá no fundo não gostar de muito do que ali acontecia, era o melhor que podia fazer de sua vida. E não arriscaria seu posto por nada. Muito menos permitiria que outra mulher utilizasse do mesmo golpe que ela para atrair Gregory.

            - Querido...sentiu minha falta? – Disse sentando-se em seu colo e beijando-lhe o pescoço. Não demorou a notar o cheiro de suor e de sexo. Mas disfarçou perfeitamente. – O que está fazendo?
            - Contabilidade. Coisas chatas e que não devem ocupar a mente de alguém tão linda quanto você. Como foi seu dia?
            - Ótimo. Fiz aquela depilação que você gosta. – Ela tornou a beijá-lo da forma como sempre o enlouquecia. Sabia quem esteve ali e quem estava despertando o apetite sexual de Gregory. Iria se livrar dela rapidamente, sem entrar em atrito com ele. – Te espero no quarto em meia hora.
            - Não posso. – Ele respondeu, pouco interessado. Beatriz havia cessado com sua libido.



            - Não? – Aquilo irritou Samantha. – E o que pode ser mais importante do que se deliciar no meu corpo? Sabe que sou só eu quem te enlouquece, não sabe?
            - Sei...é claro. Você é o meu sol, querida. Nenhuma outra a ofusca.
            - É bom mesmo. Porque se eu desconfiar que está pensando em outra das garotas, acabo com ela no instante seguinte e ficarmos sem uma mulher na boate é sempre um prejuízo.

            Além do corpo perfeito e olhos de gata, era o raciocínio gélido que o atraía. Não se tratava de uma ameaça vazia. E não seria a primeira vez, caso ela cumprisse. Em outra oportunidade havia se interessado por uma jovem menina que surgiu ali vinda do Uruguai. Ela tinha uma pureza e sensualidade displicente que pareciam atraí-lo mesmo contra a vontade. Um dia ela amanheceu morta. E ninguém ousou dizer o que todos sabiam. Sem pronunciar nenhuma palavra Gregory recebeu aquilo como prova de amor, coragem, força e crueldade. Uma combinação que o fez ainda mais apaixonado e devotado a Samantha. Ainda assim, cuidava-se. Ao menos por enquanto precisava, e desejava, manter Beatriz viva.

            - Sem prejuízos, querida. Preciso alavancar os ganhos. E é isso que me prenderá aqui por mais uma hora. Tenho uma reunião por Skype com Gabriela. E terei de lhe apresentar alguns números não tão bons.
            - Porque? A casa continua cheia como sempre.
            - Sim. Mas eles não andam gastando como no passado. Precisaremos encontrar um meio das garotas arrancarem mais dos clientes.
            - Falarei com elas. Para pedirem mais bebidas. E talvez precisasse vir mais algumas. Bem jovens. Sabe como adoram menininhas. Só temos uma com menos de 16.
            - É. Farei uma encomenda...mas...não do Brasil. A ordem é que o grupo não faça nada por lá por enquanto. Ainda há uma investigação xeretando perto demais. – Gregory explicou. Nos negócios não tinha segredos com a mulher. O único fato que lhe escondia era Beatriz se tratar de um problema pessoal para Gabriela. E isso era uma ordem expressa da chefe.
            - E quando não há?
            - Agora é diferente. A investigadora é... especialmente persistente. E está no rastro certo. – Ele resolveu se colar. – Por isso mesmo, Gabriela diz que sem o dinheiro que vem do Brasil, aqui e nas outras boates temos de lucrar mais.
            - Talvez esteja na hora de um leilão para movimentar as coisas. – A ideia já estava há algum tempo na mente de Samantha. Era momento de colocar em prática.
            - Como assim?
            - Simples. Vários clientes têm suas favoritas. E adorariam tê-las como exclusivas. O sonho de muitos aqui é ter o próprio harém. Vamos leiloar aquelas que já não dão o mesmo lucro na noite...as com mais de 25 anos. E você encomenda umas 10 ou 15 garotas jovens para por no lugar. Não precisam ser brasileiras.
            - Eu gosto da ideia...mas aqui nós temos segurança. E se alguma fugir do novo dono? E nos delatar?
            - As deixaremos bem apavoradas antes. E, se fugir, duvido que irão se meter conosco. Vão viver escondidas ou batendo ponto em alguma esquina. Não sabem fazer outra coisa. E o ‘dono’ pode ser orientado. Avisaremos que não nos responsabilizamos por fugas e que devem manter rédea curta em sua ‘escrava particular’. Eles vão adorar isso.
            - Sim...e pagarão alto pela chance e ter algo que no fundo já não nos serve. Como sempre, querida, você é brilhante.
            - Sou. – Samantha ria por dentro. Gregory realmente não imaginava o quanto ela fora brilhante. Resolveu o problema dele e de Gabriela, mas, acima de tudo, o seu. Iria se livrar de Beatriz fazendo que com alguém a comprasse. De preferência Sebastian, que além de levá-la para longe, iria tratá-la da pior forma possível e assim ela teria seu castigo por ceder aos encantos de seu marido.

            Enquanto Elizabeth tratava das próprias tentativas para convencer seus superiores de que contar unicamente com o apoio da polícia russa seria ineficiente e que ela deveria verificar pessoalmente as denúncias apresentadas por Pedro Ferraz, Miguel fazia os próprios arranjos. Ele conhecia Moscou devido aos negócios da BTez. Seu pai considerava o mercado russo de grande importância para a companhia e há mais de 10 anos era mantido por lá um escritório que servia de base aos negócios na Europa e na Ásia.
            Miguel não tinha a mesma confiança de Elizabeth de que a Polícia Federal permitiria sua ida ao país estrangeiro. E contava com isso para ela não conseguir viajar sozinha como planejava. Alguns telefonemas aos executivos locais da BTez e ele se interou das mais recentes novidades do mercado de carros por lá e deixou alinhada uma visita para breve. Seria providenciado um local para sua estadia, com a esposa. Quando Liz tivesse negada sua autorização para conduzir a investigação por lá, sugeriria que ela solicitasse uma breve licença e conhecesse Moscou ao seu lado. Nada mais natural que Elizabeth o acompanhasse em uma viagem de negócios.
            Eles estavam se acertando aos poucos. Há uma semana Miguel vivia no apartamento e, ao contrário do que imaginou à princípio, ele não fora convidado a ocupar sua cama. Mesmo assim, sentia-se mais próximo da esposa a cada dia. Dividiam o café da manhã em paz, coisa que com Rúbia por perto era impossível. À noite, preparavam e comiam o jantar entre sorrisos e até mesmo o almoço, quando as agendas permitiam, era dividido. Nem que fosse um sanduíche rápido. Isso sempre fazia Elizabeth rir ao observá-lo morder o lanche cuidando para não sujar a gravata.

            - O que foi? – Ele perguntou olhando-a com carinho. O sorriso a deixava ainda mais bela.
            - Você não combinar com comer um lanche correndo no horário de almoço. Esse não é você. Deveria estar num restaurante elegante, cercado de empresários.
            - Pois saiba que esse aqui sou eu sim, e um ‘eu’ bem mais feliz do que de costume.



            Ao menos um beijo Elizabeth ofereceu a Miguel. Aliás, aqueles afagos vinham se repetindo com grande frequencia e ela reconhecia intimamente que não sentia mais raiva por ele. Ao deixar a própria casa e o conforto a que estava habituado para viver ao seu lado Miguel provou amá-la e colocá-la acima de qualquer outro interesse. Alejandra continuava como a pedra no sapato deles. Ela ligava, fazia chantagens emocionais, queixas e choramingos que serviam apenas para irritar Miguel. Elizabeth não negava o quanto aquilo a incomodava porque era sempre uma maneira eficaz de lembrá-la da traição. A cada aparição da rival, Elizabeth sentia a ferida se abrir e precisa reafirmar a si mesma a necessidade de conviver com ela.

            - Desculpe-me! Sei como isso te incomoda. – Miguel sempre falava.
            - Sabe qual o pior? É saber que nunca mudará. Nossos filhos serão adultos e ainda assim ela se achará no direito de fazer parte da sua vida.
            - Não. Eu não irei permitir. Agora não quero tomar nenhuma atitude drástica porque ela está grávida e tenho responsabilidades com ela. Mas depois eu colocarei freio em Alejandra. Além disso, tenho esperança de que ela retorne para a Espanha e retome sua vida. Ela é um dermatologista reconhecida lá. Não tem porque abandonar sua vida para ficar aqui, infernizando a nossa.
            - E você conseguirá ficar longe do seu filho?

            Isso mexia com Miguel. Por mais que sempre dissesse não ter por Alejandra e seu bebê o mesmo carinho e dedicação que oferecia a Elizabeth e o filho deles. Ainda assim, sentia-se responsável pela criança no ventre de Alejandra e jamais conseguiria abandoná-la. Mesmo que não conseguisse conviver com ela. A alternativa seria brigar pela guarda. Isso, porém, seria esperar que Elizabeth fosse mãe não de uma, mas de duas crianças, sendo a outra uma eterna recordação da traição do marido. Não era algo que pudesse pedir a Liz.

            - Talvez eu não tenha alternativa, Liz. Vamos dar tempo ao tempo. – Foi tudo o que ele conseguiu responder antes de voltar ao trabalho na BTez. – Vejo você a noite. Vamos jantar com Matheus e Patrícia?
            - Sim. Eles chegam às 20hs. E Miguel?
            - Sim...
            - Adorei esse almoço improvisado. – Ela queria dizer muito mais, porém, isso era tudo o que podia dizer naquele momento.

            Tempo. Não era penas Miguel a esperar que ele levasse embora coisas ruins e modificasse a vida deles. Elizabeth também contava com o passar dos dias para amadurecer a ideia de ser mãe, encontrar Beatriz, encerrar aquele caso e aceitar a ideia de conviver quase que eternamente com Alejandra. Começava a pensar que se suportar a ex de Miguel era o preço para ser feliz com ele, estaria disposta a pagar. Não sem antes deixar claro a ela que seu espaço na vida de Miguel era tão minúsculo quanto uma partícula de areia.
            Esse mesmo tempo Rúbia não parecia disposta a lhe dar. Liz não disse nada para Miguel. Mas durante aquela semana a sogra telefonou para a nora três vezes. E foi ignorada em cada uma delas. Havia um profundo ódio entre as duas Elizabeth não era o sonho de nora para Rúbia e essa era a pior das sogras aos olhos de Liz. Agora estavam ligadas por aquele bebê e, ainda assim, não manifestaram nenhuma intenção de melhorar a relação. Se Liz por um momento pensou que Rúbia objetivasse uma reconciliação, mudou de ideia quando a sogra entrou em sua sala ostentado mau comportamento e um olhos de nojo para tudo o que via. Ao corpo da nora olhou com descrença.

            - Você não pode estar grávida de quatro meses. Está reta feito uma tábua. Você está enganando meu filho. Só pode ser isso! – Ela gritou antes de fechar a porta, permitindo que as pessoas no corredor ouvisse a acusação nada profissional.

          
            Elizabeth observou a sobra pesando o que lhe era mais importante. Podia responder à altura ou engolir aquela explosão de ódio avaliando que mais importante seriam manter a paz familiar. Preferiu a primeira opção. Poderia não ser a mais doce ou promissora, mas era a mais sincera.

            - Se você soubesse a vontade que eu tento nesse momento, Rúbia, de chamar um policial e mandar lhe prender, fecharia essa porta delicadamente e se sentaria sem me irritar mais.
            - E sob qual a alegação iria me prender? Lhe gritar a verdade? – Apesar da resposta, a idosa fez o que Elizabeth ordenou e sentou-se após fechar a porta às costas.
            - Garanto que sou capaz de pensar em várias desculpas para prendê-la. Desacato é a minha favorita!
            - A postura típica dos prepotentes que lotam as delegacias desse país.
            - Eu é quem age com prepotência, está certo...diga o que deseja de uma vez! Antes que eu me arrependa!
            - Quero saber se está realmente grávida e se é meu neto.
            - Realmente não é da sua conta! E se respondo é porque tenho boa vontade além do que você merece! O filho que espero, apesar de estar magra ‘feito uma tábua’, é de Miguel. O lhe faz seu neto. Questão respondida. Então já pode deixar minha sala.

            Rúbia não estava convencida. Considerava aquilo azar demais. Principalmente quando Miguel seria pai da criança gestada por Alejandra. E a incomodava também o fato da gestação de Elizabeth estar mais avançada. Afinal, o primogênito deveria ser o filho de Alejandra, uma mulher digna de ser a mãe de seu neto. Ainda assim, caso fosse verdade, seria obrigada a aceitar uma relação mais estável com Elizabeth. Sendo seu neto, pensava, seria responsabilidade dela ensiná-lo coisas que alguém Elizabeth não tinha condições.

            - Não sei o que meu filho vê em você. Não tem nada que explique essa atração. Nem classe, nem educação, nem elegância....nada. E quando pensei ver-me livre de você, anuncia uma gravidez. Foi um momento muito propício para decidir procriar, Elizabeth, mesmo indo contra ao que você dizia entender como correto para uma mulher moderna e com carreira!
            - Destile todo o veneno que desejar Rúbia. Simplesmente não me atinge. Por mais que me odeie, é no meu apartamento que o seu filho escolheu viver. E esse bebê aqui será o seu primeiro neto, goste ou não. Agora saia ou eu mando lhe prender. Não estou brincando. – Lá no fundo aquelas ofensas a feriam. Principalmente por acreditar em cada uma. Alejandra realmente a superava em elegância, beleza e classe. Educação não. Ao menos na educação que ela considerava correta e ia além de regras de etiqueta. – Não preciso que goste de mim. Mas saiba que resolvi lutar pelo meu casamento. E Alejandra deve se contentar em ter conseguido uma noite e um filho de Miguel. Não terá mais nada. Porque ele é meu, vocês gostando ou não, ele é meu marido. E assim continuará!
            - Ele solicitará exame de paternidade, já lhe aviso. – Rúbia disse ao sair. – Espero que tenha certeza de que é de Miguel.
            - Saia daqui! – Liz gritou e viu a porta se fechar. Teria de tirar a limpo aquela história de DNA. Obviamente não se negaria a fazer o exame, mas não gostou nada de ouvir a sugestão vindo da sobra.

            Após uma anotação mental de que aquele assunto deveria ser discutido ainda naquela noite antes ou depois do jantar com Matt e Patrícia, Elizabeth voltou ao trabalho. Tinha muito o que fazer na Polícia Federal. Atualmente estava trabalhando para reunir elementos que comprovassem a veracidade da delação de Pedro Ferraz enquanto ele seguia preso, aguardando a concretização do acordo. Para ele entrar em vigor, tudo o que disse teria de ser provado. Só então ela conseguiria continuar com a investigação e ir para a Rússia procurar por Beatriz. Isso explicava a fúria e dedicação com que seguia investigando, sem se importar com o cansaço.

            Sem sequer desconfiar do quanto Elizabeth estava perto de resgatá-la, Beatriz descobria que a Rússia podia ser ainda pior do que pensava. Principalmente quando se irritava Samantha. A mulher de Gregory a observava a todo o momento. E era muito mais rigorosa com ela do que com as demais garotas. Desconfiava do interesse de Gregory, isso estava claro. Isso Beatriz, como mulher, conseguia entender. O difícil era tentar adivinhar o que ela estava esperando conseguir com aquele comportamento. Ao invés de cuidar das atitudes de seu homem, Samantha dedicava-se a dificultar a vida de Beatriz. E estava conseguindo.
            Sua mais recente atitude foi colocá-la para trabalhar na rua. As calçadas eram lugares onde normalmente as garotas sem clientes ricos ou fixos eram colocadas. Rendiam pouco dinheiro e eram de grande risco. As roupas usadas eram mais vulgares e o comportamento também. Ao contrário de Sebastian que valorizada a elegância e discrição, os homens a quem desejavam que se oferecesse pareciam desejar alguém que não se valorizasse ou realmente não tivesse valor algum. Beatriz julgava não ser possível se sentir mais humilhada. Mas quando se viu pronta para sair, usando um vestido vermelho e longas botas, pensou ter chegado ao fundo do poço.



            - É, parece que você realmente despertou o ódio dela. – Naomi disse ou vê-la. A roupa não deixava dúvidas de qual era o destino.
            - Não enche o saco! – Pela primeira vez Beatriz perdeu o controle com a oriental cujas emoções eram difíceis de entender.
            - Calma...não é a mim que sua raiva quer atingir.
            - Não estou com paciência para os seus olhares. Quero entender, Naomi, porque você parece ter o prazer de vir falar comigo unicamente para trazer recados ruins ou me espezinhar. Porque?
            - Não te odeio, Beatriz. Mas claramente alguém aqui sim. Eu apenas observo. Desculpe se meus olhares te incomodam. É apenas a minha forma de sofrer...também não queria estar presa aqui.
            - É fácil perceber.
            - Cuidado com Samantha. Você tem clientes. Não é normal te mandarem para rua assim. Ela teme que você lhe roube Gregory e isso a descontrola. Fique de olhos abertos.

            Não foi um grande conselho. Beatriz já tinha deduzido aquilo sozinha. Ainda assim, era melhor ter Naomi próxima de si. Ela realmente era uma mulher observadora. Devia saber de muito ali porque passa desapercebida de muitos.
            Beatriz deixou o assunto de lado e seguiu para a rua, cumprir sua missão. Ou se castigo, conforme o ponto de vista. Sabendo que ela e as outras eram observadas à distância por seguranças, fez da calçada seu ambiente de trabalho. De dia o frio de Moscou fora substituído por uma temperatura amena. O vento incomodava pela roupa que expunha o corpo, mas caminhando conseguia suportar bem. Pior eram os olhares. As famílias que passavam de carro evitavam olhá-la. Representava algo feio a que simplesmente ignoravam. Já os homens sozinhos a cobiçavam. Poucos realmente manifestavam algum interesse.
            Ficou ali, flertando com um e com outro. Se oferecendo sem saber se aquele possível cliente era ou não um risco. Ainda assim, mantinha um falso sorriso no rosto e a postura erguida do peito. Sobreviveria a mais aquela humilhação e encontraria um forma de desviar do ciúme feroz e rastejante de Samantha.
            Um homem de baixa estatura e cintura roliça aproximou-se com uma expressão que beirava a timidez. Beatriz simpatizou com ele. Tinha cara de homem inofensivo. Do tipo que havia brigado com a esposa e que na hora do jantar já estaria arrependido da traição e chegaria em casa com um ramalhete de flores e um pedido sincero de perdão. Sim, serviria para encerrar aquela tarde da maneira menos desagradável possível.
            Na primeira vez que tentou falar com ela, o homem disse algo em russo, incompreensível a Beatriz. Depois repetiu em inglês e enfim pôde compreender que ele lhe fez um elogio.

            - É muito bonita, jovem. – Algo muito simples, mas que fez bem a alguém quase desacostumado a gentilezas.
            - Me quer? – Foi sua resposta objetiva.

            Ele a queria. Estava em seus olhos cheios de cobiça. E teria levado-a para algum hotel próximo com o objetivo de ter sexo rápido e sem compromisso. Teria, caso alguns passos firmes não tivessem feito o homem se distrair.



            Quando olhou para trás Beatriz viu Sebastian se aproximar calmamente e com um olhar ameaçador. Estavam a apenas duas quadras da boate, numa área onde prostitutas de rua não eram nada surpreendente. O estranho era vê-lo ali. Um pouco mais atrás Bia avistou o segurança Francisco. É claro, aquela área não era muito segura. E só o fato dele ter decido do carro representava algo inseguro ao profissional.

            - Entre no carro, Beatriz. Agora. – Ele ordenou.
            - Não posso. Estou...trabalhando. – O cliente a quem sequer sabia como se chamava permanecia calado. Provavelmente se sentindo intimidado por  Sebastian.
            - Estou vendo. Mas entre no carro agora. Seu...ele...pode encontrar outra.
            - Mas... – Beatriz olhou em direção ao segurança que observava tudo do outro lado da rua, ao telefone, provavelmente informando Gregory do que ocorria.



            - Agora! – Sebastian gritou. – Eu já avisei a ele que você tinha conquistado um cliente.

            Do carro Beatriz viu Sebastian conversar rapidamente com o homem com quem deveria estar e dispensá-lo rapidamente. Quando ficou sozinho o segurança da boate se aproximou e eles pareceram discutir, mas Bia não conseguia ouvir o que diziam. Ao que parecia, Gregory não gostou da mudança de planos. Ainda assim, Sebastian deu-lhe as costas e caminhou lentamente para o carro. E, mais uma vez, Beatriz surpreendeu-se com a frieza daquele homem. Ele acabara de fechar um negócio. O seu aluguel por aquela tarde. Entrou no carro, beijou sua mão como se ela não estivesse vulgarmente se oferecendo na calçada instantes antes e fosse uma dama.


            - É bom tê-la aqui. – Disse simplesmente. – Para o hotel, Francisco. Por favor.

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