domingo, 7 de junho de 2015

Alguém Para Amar - Capítulo 9

            Não fosse Emily estar com pressa para chegar ao restaurante e Jonas, no fundo, entender que ela realmente precisava ir, eles teriam continuado aquele bate boca sem perceber que não estavam sozinhos. Lorenzo estava achando até típico. Casal não era casal de verdade sem brigas. Duas pessoas diferentes precisavam divergir de vez enquanto ou, no mínimo, não se importavam muito uma com a outra. Eles iam encontrar um meio termo e, cada um cedendo um pouquinho, buscar a felicidade. Ele pensou em sugerir uma saída.

            - Eu acho a noite de hoje perfeita para conhecer o restaurante de Emily. – Disse e viu um sorriso surgir no rosto da cunhada, acompanhado pela expressão de desânimo de Jonas. – Não reclame, meu irmão. Não é questão de escolha. Emily tem suas responsabilidades profissionais, assim como nós.
            - Mas ela está em repouso por indicação médica! – Jonas argumentou.
            - Por isso mesmo! Ela não precisará dirigir. Você nos levará no seu carro enquanto Emily repousa. Ela cuidará do restaurante por essas últimas três horas que faltam ao expediente, enquanto nós apreciamos um belo jantar. E você aproveita para ficar de olho nela.



            O lugar estava cheio e, ao entrar, Jonas entendeu que sua namorada era realmente necessária ali. Mesmo assim, preferia estar no sofá de sua sala, com ela sentada ao seu lado. A realidade era um pouco menos desagradável devido ao sabor da comida e o belo atendimento que a equipe liderada por Márcio oferecia no salão.

            - Senhor Jonas, é um prazer recebê-lo novamente e dessa vez acompanhado de seu irmão. Não cometerei a gafe de lhe oferecer a carta de vinhos. Posso trazer o seu favorito? – Márcio disse.
            - Pode sim, Márcio. E pode também me fazer o favor de ficar de olho em Emily. Não a deixe se esforçar muito.
            - Àquela cozinha está uma loucura! Mas ela sabe se manter na linha. E me pediu para serviços com cuidado especial.
            - Ele é sempre assim tão formal? – Lorenzo comentou.
            - Sim. Trabalha com Emily há muito tempo e é de total confiança. Além de ser uma figura e tanto.

            Eles comeram e beberam muito bem. E Jonas teve de reconhecer algo que, após tantos anos frequentando o lugar, só agora percebia. Emily era competente. Não se tratava de um hobbie ou de algo apenas profissional. Era ambos. Ela tinha sim talento com as panelas e, também tornou-se uma grande administradora. O resultado dessa soma de talentos foi uma mulher com carreira de sucesso. Ao irem embora, Jonas sentia o peito estufado de orgulho.

Seis semanas depois...

            Lorenzo já estava bem adaptado a São Paulo e vivia bem no seu novo apartamento. Mesmo que o espaço reduzido e a falta de verde da vista de sua janela o incomodassem. Ele e Jonas revezavam-se em visitas a Bento Gonçalves. Ou os pais reclamavam do afastamento de ambos os filhos. Além disso, a vinícola exigia atenção. A consultoria em administração empresarial ainda estava em fase de abertura e, mesmo assim, ele já vivia as alegrias e dificuldades de se dividir entre duas empresas.
            Nada do qual Jonas não experimentasse há vários anos. Na contramão, Jonas tentava fazer o oposto de Lorenzo. Ele se via forçado a abrir espaço em sua agenda para questões pessoais. Não era culpa de Emily nem algo que complicasse a sua rotina. Ao menos era isso que ele vivia repetindo para acalmá-la. Há alguns dias, a médica de Emily liberou-a para seguir com o tratamento para engravidar. Leonor afirmou que o útero de Emily estava recuperado da raspagem e que podiam seguir com os procedimentos. Isso significava consultas, exames e tratamentos muitas vezes nada agradáveis.



            Emily estava utilizando uma combinação de medicamentos por via oral e, também, injeções subcutâneas para melhorar as chances de ovulação. Ela jurava que não sentia dor ou desconforto algum e parecia mais animada do que nunca. Mesmo assim, não era algo agradável de ver então não deveria ser muito bom de fazer. E se o bebê era um desejo dos dois, não achava justo ela ter de passar por aquilo sozinha. As injeções podiam ser aplicadas em casa mesmo, mas, a cada quatro dias ela tinha de ir ao hospital e fazer exames hormonais. E surgiam mais agulhas.

            - Acalme-se, Jonas. Você também terá sua quota de sacrifícios. – Leonor lembrou-o.

            Era verdade. Como a médica explicou, os ovários e trompas de Emily foram muito comprometidos pela endometriose. Então, sua melhor chance de ter um bebê era a inseminação artificial. E era padrão nesses casos, também testarem a qualidade dos espermatozóides antes de realizarem qualquer procedimento.

            - Mas quem não é saudável sou eu. – Emily argumentou sabendo que aquilo era constrangedor para qualquer homem.
            - Não sabemos. – Leonor respondeu. – E temos de maximizar nossas chances já que você já tem problemas. Então vamos testar os espermatozóides de Jonas.
            - Não tem problema, Emily. Eu faço. – Ele disse apertando sua mão bem firme dentro da dele.

            E lá estava ele, numa sala pouco amigável, fingindo não haver nada de estranho. Estava sentado numa poltrona confortável. No chão um tapete felpudo. À sua frente uma televisão moderna. Não fossem as capas de revistas masculinas, poderia fingir estar numa sala de estar comum. O potinho de plástico na mesa à sua esquerda não deixava dúvidas. Estava ali, depois de vários dias de abstinência, para coletar seu esperma. Depois a equipe médica faria testes para descobrir se ele poderia engravidar sua namorada.

            - Teve um tempo em que essas coisas eram mais fáceis. – Resmungou.

            Preferiu usar apenas nos próprios pensamentos para se excitar e aproveitou para pensar que naquela noite estaria liberado para tocar Emily. Estava há dias sem ela devido a esses testes. Não demorou para concluir a coleta.

            - Me desculpe por isso. – Emily disse assim que saíram da clínica.
            - Fique tranquila. Eu estou muito bem. E nós ficaremos bem.

            Ficaram deliciosamente juntos naquela noite. Jonas aproveitou para mostrar o quando a desejava. Emily vinha dizendo que ele a mimava muito e tratava-a como se fosse se quebrar a qualquer toque desde que soube de sua doença. Aquela noite lhe pareceu uma ótima oportunidade para mostrar que não era assim.



            - Eu quis você por todos esses dias. Sempre quero. Mesmo quando não posso ter. – Lhe disse enquanto beijava seu rosto acompanhando a linha do maxilar delicado.
            - Então me tenha. Sou toda sua. – Emily respondeu.

            Naturalmente pouco carinhosa e mais objetiva no dia a dia, na cama Emily sabia como fazê-lo se sentir amado na cama. Jonas não gostava de pressa e ela dedicava-se a acarinhá-lo lentamente. Deliciava-se em beijar aquela pele perfeita, que somente ele tinha.

            -É inacreditável o quanto você é lindo. As mulheres devem se atirar na sua frente. Loucas por um pedacinho seu.
            - Elas não têm. Sou só seu. – Ele respondeu devolvendo os afagos com beijos acalorados.

            O resultado de todos aqueles exames ainda levaria alguns dias e Emily estava nervosa. Seu estado de espírito não melhorou muito quanto Jonas pediu por sua companhia num evento da construtora. Ela disse sim, imaginando se tratar de um jantar de negócios em que ela teria de entreter dondocas chatas enquanto ele assinava contratos. Mas não era bem isso.
           
            - A JRJ Construtora irá receber um prêmio e, durante a festa, vamos lançar um empreendimento imobiliário classe A. Essa construção envolve muito dinheiro, por isso queremos atrair holofotes para ela.
            - Claro que eu estarei lá. – Ela disse.



            Ela chegou ao evento ao seu lado. E posou para os fotógrafos junto dele. Orgulhoso, Jonas informava a todos que perguntavam quem era sua bela acompanhante que aquela era sua namorada...e futura esposa. Quando ouviu Emily disfarçou a surpresa, quase susto, e só questionou Jonas quando ficaram sozinhos.

            - Que história é essa de futura esposa?
            - É o caminho normal de um relacionamento, não? Namoro, noivado, casamento. Família.

            Aquilo pegou Emily de surpresa. Palavras como noivado e casamento nunca passaram por sua cabeça. Logo foram interrompidos por um empresário que veio cumprimentar Jonas e ela não teve chance de responder. Foi bom. Assim teve mais tempo para assimilar aquela novidade.
            Para quem os observava, no entanto, aquilo não era inesperado. A forma como os dois sorriam juntos, conversavam e se tocavam numa naturalidade típica dos casais que se conhecem há muito tempo, fazia com que alguns já acreditassem que eram casados. À mesa do jantar, Emily conversou amigavelmente com alguns dos convidados. Eles ficaram encantados com a namorada de Jonas.

            - Fez uma grande escolha. Ela é maravilhosa. – A esposa de um amigo de longa data disse.
            - Sim, ela é mesmo. Sou um homem de sorte. – Jonas respondeu.

            Emily o observava, embevecida na beleza daquele homem, hoje vestido elegantemente para atrair olhares. Ele tinha alcançado o objetivo.



            Além de Lorenzo e Emily, outras pessoas queridas para Jonas estavam prestigiando o evento. Juliana e Rafael, seus sócios na construtora, sentaram na mesma mesa. Rafael veio acompanhado da esposa, Melissa. A amiga de Emily já os tinha desculpado pelo relacionamento escondido e agora apoiava o casal. Estava adorando a ideia delas, amigas há tantos anos, namorarem os sócios da mesma empresa
            Já Juliana estava deslocada. Ela sempre teve uma amizade distante com Melissa e nunca se relacionou com Emily. Ela lembrava-se da loira, chefe de cozinha, que foi madrinha no casamento de Rafael e Melissa. Mas há algumas semanas foi surpreendida com a notícia que Jonas a estava namorando. E, ainda pior, tratava-se de algo antigo e agora eles viviam juntos.



            Juliana sempre pensou que Jonas seria um eterno solteiro. Não sozinho, é claro. Era bonito e agradável demais para isso. Mas nunca o imaginou num relacionamento sério. Ainda mais depois dele tê-la carinhosamente dispensado após algumas saídas.

            - Você é minha sócia e minha amiga. Não vou estragar a nossa relação por algo passageiro. – Ele lhe disse.

            Foi delicado, foi simpático e, mesmo assim, doeu ser dispensada por ele. Superou apenas pela certeza de que ninguém seria capaz de fazer Jonas desejar compromisso. Por isso sua decepção em vê-lo derretido por Emily.

            Essa decepção não passou despercebida por Emily. Juliana cobiçava Jonas, estava em seus olhos. E mesmo não tendo nenhuma razão para sentir ciúme, o sentimento estava ali, pronto pra derrubá-la.

            - Ela o quer. Dá para ver de longe. – Disse para Melissa.
            - Sim, sempre quis. Mas Jonas a dispensou quando eu e Rafael ainda namorávamos. – Esclareceu a amiga. – Ela está enciumada. Apenas isso.
            - É. Mas não gostei disso. – Um sentimento possessivo começava a tomar conta dela.

            Na hora em que Juliana foi ao toalete, resolveu que era hora de mostrar as garras. Juliana passava tempo demais com seu homem, precisava entender definitivamente que aquele belíssimo representante do sexo masculino tinha dona. Ficou ali, retocando seu batom enquanto Juliana usava o reservado. Só o olhar assustado que a ruiva lhe deu quando percebeu sua presença já confirmou suas desconfianças.

            - Oi...é Emily, certo? Jonas não chegou a nos apresentar. Sou Juliana, sócia dele.
            - Muito prazer em conhecê-la, Juliana. Sou Emily. O Jonas não teve oportunidade de nos apresentar.
            - É verdade. Mas eu sei que você é namorada dele.
            - Mais do que isso, na verdade. – Emily teve o prazer de responder.
            - Aaaa claro. Vocês dividem o apartamento. – Ela fez soar como dois adolescentes repartindo um quarto e sala por falta de opção.
            - Mais do que isso. – Emily repetiu.
            - Acho que eu não entendi.
            - Eu explico. – Nada daria mais prazer a Emily naquele momento. – Sou a futura esposa de Jonas. Ou a noiva, se você preferir.
            - É, eu...eu...não sabia. Desculpe-me.
            - Não se preocupe. Agora você já sabe. É ótimo termos esclarecido essa questão.

            Emily logo deixou o banheiro e voltou para os braços do namorado, agora noivo. Ele não fazia ideia do clima ruim entre as duas. E nem precisava. Certo era que agora Juliana se comportaria. E ela gostou do novo título.

            - Será que está bom de festa por hoje? Eu gostaria muito que você levasse sua futura esposa para casa agora. – Disse em seu ouvido.
            - Você gostou? Achei que iria...estranhar.
            - Eu gostei, claro. É bom saber que você me quer como sua mulher. Um dia, quem sabe, nós vamos casar.
            - Um dia? Você acha que será distante assim? – Ele achou lindo o rubor que surgiu em seu rosto e resolveu arriscar. Ergueu o tom de voz e subiu novamente no palco onde minutos antes recebia o prêmio. – Senhores! Peço a atenção de todos.



            Quando todos se voltaram para ele novamente, muitos estranhando vê-lo novamente sobre o palco, ele olhou para Emily e disse palavras as quais jamais imaginou repetir para uma mulher.

            - Eu peço licença para interromper a festa de todos para informá-los de que essa linda mulher chamada Emily Fruett aceitou tornar-se minha esposa. Foi algo surpreendente e por isso eu ainda não lhe comprei um anel. Mas não podia perder a oportunidade de dizer aos senhores que ela é minha. E, muito em breve, oficializaremos nossa união.

            Ao descer do palco sob aplausos, Jonas beijou Emily e decidiu não deixar a festa ainda. Queria dançar com ela mais um pouco. Seguiram para a pista sendo observados por muitos dos convidados.
            Mas não todos. Lorenzo não viu o irmão comprometer-se em público com Emily. Já estava tarde para os seus hábitos e ele resolveu ir dormir. Surpreendeu-se ao pegar seu carro debaixo de chuva intensa. Dentro do salão eles não perceberam, mas um verdadeiro dilúvio havia caído na cidade de São Paulo. E ele precisava rodar muito até alcançar o bairro onde ficava seu novo apartamento.



            Mesmo no horário avançado, o trânsito seguia com problemas porque muitas ruas foram interditadas por alagamento. Ele, que ainda não conhecia bem toda a cidade, surpreendeu-se ao ter de fazer um trajeto muito diferente. E assustou-se ao ver pessoas empurrando carros enguiçados ou caminhando com água na altura dos joelhos. As estações de rádio davam conta de que muitas pessoas não conseguiram pegar seus coletivos para ir para casa.
            Todo aquele caos de cidade grande o assustava. E só ficou pior quando viu alguém conhecido. Avistou Jéssica, encolhida numa calçada, tentando abrigar-se da chuva sob uma marquise. Ela segurava uma criança, enrolada num grande casaco. Dela, provavelmente, já que em sua blusa de manga curta a jovem parecia tremer de frio. Ele parou o carro junto da calçada e abriu a porta do carona.

            - Entre! Eu te levo para casa! – Era um convite, mas soou como uma ordem. Melhor assim. Naquela situação, não poderia lhe dar as costas e ir embora abandonando a funcionária de seu irmão ali. Lorenzo dizia  a si mesmo que não passava de uma gentileza necessária.
            - O senhor....o senhor...aqui. É...inacreditável. – Foi o que Jéssica disse ao entrar no carro e encharcar o banco.


            - Lorenzo, Jéssica. Só Lorenzo. Me diga onde você mora. Eu te levo em casa.

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