domingo, 22 de março de 2015

Diaba Ruiva - Cap 13 parte I



            Antes mesmo de deixar o cais, no entanto, Rachel teve de se explicar não apenas a Peter, mas também Stone. Numa rara saída dos escritórios do FBI, o chefão deixou claro que a conduta dela estava longe da esperava e sugeria uma instabilidade emocional grave, talvez séria o bastante para devolvê-la à prisão. Rachel foi rápida em responder para ele.

            - Dane-se!
            - O que disse?!?!
            - Isso que você ouviu, Stone! Eu respeito quando Peter me repreende porque ele conhece o trabalho de campo. Sabe como é! Para você é muito fácil, do alto da sua torre, dar ordens e esperar o resultado sem nunca sujar as mãos. Vou encontrar meu marido! E, se meus métodos lhe incomodam, sinto muito. Eles são eficientes. Não é o que sempre lhe interessou?



            - É, talvez seus bons resultados valham os métodos questionáveis. Mas eu espero que você tenha uma boa explicação a dar quando esse homem acordar no hospital e acusá-la de abuso de autoridade. – Ele lhe deu as costas e saiu. Antes de passar pela porta, porém, lhe deu mais um recado. – Ocupar meu cargo é resultado de promoções. Eu vim do campo, Rachel. Como você e Peter.

            Nohan deixou-os. Rachel esperava ter de enxotá-lo para não seguir ao bar, mas ele avisou de que voltaria à embaixada e depois iria ao hospital. Queria ele mesmo ter uma conversa com Zack, impedindo-o de fazer uma reclamação contra Rachel, ligou para Melissa para que ela o encontrasse no hospital, queria ajuda para argumentar com Zack a não prestar queixa contra a agente. Stone estava certo. Aquele grão de arreia no imenso deserto de problemas na ficha dela poderia prejudicá-la no FBI. E Nohan não permitiria.

            - Cuidado com o que faz e o que fala, Rachel. Entendo seu nervosismo. Mas tente se manter na lei. – Aconselhou-a.


            Enquanto isso, Neal trabalhava calado e ferozmente em suas esculturas. O trabalho manual ao menos conseguia relaxá-la enquanto a mente pensava sem parar um instante. Gostava de esculpir. Mas nem essa atividade conseguia distraí-lo do fato de estar numa cela, sob a mira do revólver de um bandido perigoso e sem nenhum medo de matar. Thomas Carter havia lhe dito estar se aposentando. As peças por ele construídas seriam vendidas como originais e lhe garantiriam muito dinheiro.



            O homem podia não ter dito com todas as palavras, mas obviamente, o plano não incluía uma testemunha viva de tudo aquilo. Ele não sairia vivo dali. Quando terminasse de esculpir, aquela arma seria disparada. Quase sem perceber, Neal diminuiu o ritmo de trabalho. Precisa dar mais tempo à Rachel. Ela viria,estava à caminho, certamente.

            - Está fazendo corpo mole, Neal? – Thomas gritou.
            - Pensei que desejasse algo bem feito não uma modelagem de pré-escola feita em massinha de modelar! Sou um profissional, tenho meu tempo.
            - Aprece-se, Neal. – Repetia ele de tempos em tempo apontando a arma para sua cabeça. Mas Neal sabia que sua vida estava garantida enquanto ele precisasse de seu trabalho.

            Enquanto esculpia, Neal mantinha a atenção em Thomas e algo o surpreendeu. Carter combinava outro negócio. Aquele papo de aposentadoria não passava de uma mentira.


            - Yuri, não seja covarde, meu amigo. Um diamante é sempre um diamante. – Ele ria falsamente. Estava ludibriando o homem do outro lado da linha. - Se vier rodeado de rubis e esmeraldas, ainda melhor.

            Neal percebeu que Carter tentava convencer o outro a cometer um crime. Dizia ser fácil, impossível da polícia descobrir. Nesse momento Neal realmente entendeu aquele homem. Carter era um criminoso psicológico. Ele convencia os outros a agirem ao seu comando. Tinha James nas mãos e agora envolvia Yuri, seja quem fosse ou estivesse. Thomas Carter não gostava de sujar as mãos.

            - Aprece-se, Neal. – Disse Carter mais uma vez ao desligar o telefone.


            Quando a noite caiu, Rachel estava no bar. Tinham a ficha completa de James. Por isso foi fácil reconhecê-lo assim que entrou. Era um homem alto, típico inglês de barba arruivada e olhos azuis acinzentados. Tratava-se de um belo homem. E, considerando a forma atenta com que entrou e logo ocupou uma mesa estratégica com vista para todo o salão, não seria fácil como com Zack. Ali estava um soltado leal e eficiente de Thomas Carter. Ele trazia uma mochila nas costas. Provavelmente, dinheiro para pagar Zacker pela participação no sequestro. Nada mais o faria encontrar-se com o comparsa.

            - James chegou sozinho, de moto, Rachel. – Henrique disse pelo rádio.
            - Rastreie a placa. – Ela respondeu enquanto trocava um olhar com Peter, sentado em outra mesa, mais próximo de James. – Espero sua permissão para me aproximar, Peter.

            Peter chegou a surpreender-se com isso. Rachel esperando sua permissão? É, ao que parece, ela ainda mantinha algum pensamento lógico, mesmo completamente descontrolada.

            - Mas se não der sinal verde logo, chefe, irei mesmo assim. – Ela complementou. Não perderei o alvo.
            - O alvo está na minha linda de visão, Rachel. Sossegue. Não quero tiros aqui. Esse lugar está lotado e teríamos vítimas. Aguarde o meu comando.

            Não era uma atitude fácil para Rachel. Em especial quando seu marido estava desaparecido. Mas ela a cumpriu as ordens de Pitter e observou James fazer várias ligações no celular. Ele deveria está tentando falar com comparsa e não conseguia porque o aparelho foi apreendido por Peter. Quando ele se levantou, Rachel imitou o gesto. Iria segui-lo.

            - Parada! – Peter ordenou. – Henrique está lá fora e vai segui-lo. James nos levará até Neal e nós prenderemos Thomas também.

            Rachel estava de acordo com aquele plano. Mas não com a parte de ficar sentada. Seguiu para a porta e pulou na garupa de Henrique. Quando James arrancou com sua moto e acessou a rua cheia de carros, eles estavam com apenas três carros separando-os. Peter e Diana vinham logo atrás.

            - Não ouse perdê-lo, Henrique. Você sempre foi bom piloto.
            - Pode deixar.

            Eles rodaram praticamente 50 minutos em alta velocidade com um fluxo razoável de carros. Isso lhes dava alguma facilidade de disfarçar a perseguição. O problema começou quando James acessou uma rua paralela, com poucos veículos. Logo James iria reconhecê-los.

            - Diana, não temos muito mais tempo. Pesquise onde essa rua vai dar. Quais possíveis esconderijos temos daqui?

            A agente ia como carona no carro e tentava analisar mapas pelo notebook. Era difícil dizer. Tinham duas opções de destino. À esquerda ficava um pequeno bairro residencial, com casas grandes e habitadas por pessoas da alta classe social. Thomas seria louco de fazer daquele lugar um esconderijo? Ela responderia que sim. Mas se virassem à direita iriam se deparam com uma região comercial, fabril e pouco habitada naquele horário. Seria o destino mais provável.

            - Ligue para a central e mande uma equipe varrer a região residencial, nós vamos à direita. – Peter ordenou. - Rachel, você e Henrique continuam seguindo James para o caso de não encontrarmos Thomas e Neal. Não faça nada de que vá se arrepender depois, Rachel. Preciso dele vivo. Então ande na linha, entendeu? Eu falo sério, Rachel!

            - Entregarei ele vivo para você, Peter.

            Ela falava sério. Não pretendia matar James. Lutou muito por seu posto no FBI e não seria aquele bandidinho a lhe tirar a liberdade novamente. Mas ‘vivo’ não significava ‘intacto’. Ele ia se arrepender de sequestrar seu homem. Isso ia.

            - Acelere, Henrique. Quero que se aproxime de James. Quero que emparelhe a moto com a dele. Vamos tirá-lo da estrada.
            - Só pode estar de brincadeira!
            -Não mesmo. – Ela já tinha a arma na mão e com o outro braço segurava firme na cintura do amigo. Estavam em alta velocidade e seus cabelos voando atrapalhavam. – Vou atirar no pneu traseiro dele.
            - Ele vai frear e será jogado longe!
            - Uma pena, não? – Rachel sabia que o tombo não iria matá-lo. – Vamos Henrique! Aproxime-se para eu conseguir mirar nessa escuridão! Não desejo acertar nele...ainda.

            Henrique viu o ponteiro do velocímetro alcançar 120km/h e Rachel segurar-se a ele mais firmemente. A mão dela tremia. Aquela calma era só aparência. Ela estava nervosa por Neal e, também, por ter de acertar um tiro a noite e com o alvo em movimento. Ela demorou a efetuar o disparo. Tanto que James chegou a percebê-los. Antes, porém, dele conseguir pensar em escapar, Rachel apertou o gatilho. A bala fez o pneu estourar, a moto diminuir a velocidade rapidamente saindo da estrada e ele ser catapultado em direção as árvores que cercavam o lugar. Henrique também diminuiu a velocidade e Rachel saltou logo depois.
            James abriu os olhos sentindo o corpo moído. Tinha ouvido o tiro, percebido a moto perder a estabilidade instantes depois de olhar para trás e ver uma moto persegui-lo. Nela havia um homem vestindo preto e capacete prata. Na garupa uma mulher de cabelos avermelhados. Lembrava-se de Carter falando de uma ruiva perigosa, a quem deviam ficar atentos. Era ela. Não teve tempo de reagir e depois de rodar no ar algumas vezes, sentiu seu corpo se chocar com o chão. Ao abrir os olhos ela estava lá, à sua frente, com a arma em punho.




            - Sejamos breves, James. Você fala e vai preso. Fica calado e vai preso do mesmo jeito...mas com alguns hematomas a mais pelo corpo e alguns litros de sangue a menos. Fui clara?
            - Pode me torturar ruivinha...daqui não sai nada. Me mate e nunca saberá do homem que procura.

            Aquilo não era verdade. Peter e Diana estavam procurando o esconderijo e iriam encontrar. Não eram tantas alternativas assim. Ela tinha cortado a comunicação para Peter não ouvir sua ‘conversa’ com James. Ele não aprovaria o método. Isso, infelizmente, significava não saber como está a busca. Mesmo assim, tinha uma longa distância entre torturar e matar.

            - Pois bem, James. Foi você quem escolheu o modo mais difícil. Vamos brincar de tiro ao alvo. Eu vou contar até três e se você não falar algo bem interessante, o primeiro tiro acertará seu pé esquerdo, logo acima dos dedos.
            - Ela é boa de mira, só avisando. – Henrique já conhecia aquele jogo.
            - UM... DOIS...
            - Você não pode! Policiais não podem atirar quando o acusado não está armado.
            - Para o seu azar, eu não sou mais uma policial. TRÊS! – Ela apertou o gatilho e a bala atravessou a cartilagem do pé de James exatamente onde ela avisou. Ele urrou de dor.
            - Sua vadia! AAAAA que dor! Demônia! Dói!!! – Ele se contorcia.
            - É parece que usará muleta por algum tempo, James. Cuidado como fala comigo, mantenha a classe, por favor. A segunda rodada está prestes a começar. Agora será o pé direito, mesmo local. Você deve pensar se quer usar cadeira de rodas ou abrir o bico logo. UM...
            - Não, por favor não..
            - DOIS...
            - Eu imploro.
            - TRÊS! – Ela acertou em cheio o segundo tiro e James agora gritava e sangrava nos dois pés.

            Em completo desespero o homem pensava se valia a pena ser leal a Thomas Carter. Já tinha lucrado muito com seus golpes. Poderia abandoná-lo. A ruiva já tinha lhe provado não estar para brincadeira. Mas a quem tentava enganar? Simplesmente não podia trair Carter. Ele o encontraria no inferno e o faria pagar. Achou ter descoberto sua salvação quando o celular vibrou em seu bolso. Tinha de ser Carter.

            - Socorro!!! É Ela! – Mas não conseguiu falar mais porque outro tiro foi disparado e esse não apenas arrancou e destruiu o celular como acerou a palma de sua mão esquerda.
            - Achava mesmo que ia deixá-lo pedir socorro, James? – Rachel provocava-o com um sorriso.
            - Você não entende. Ele fará da minha vida um inferno se eu o entregar. E irá me matar.
            - Acho que não entendeu, James. Serei ainda mais clara: Seu inferno sou eu. Sou eu quem irá matá-lo se continuar cansando minha paciência. Eu tenho essa arma, muita munição nessa mochila e nem uma gota de piedade por você. Mexeu com a mulher errada, James. Sequestrou o meu marido. E isso eu não esquecerei fácil.
            - Eu não lhe fiz nenhum mal. Não o machuquei.
            - Ótimo. Agora fale onde ele está ou eu vou continuar a brincar de tiro ao alvo. Posso acertar dezenas de tiros em você, James, sem nenhum atingir órgãos vitais. Você implorará por uma bala fatal tamanha a dor que estará sentindo e eu não apiedarei de você. Seu sangue se esvairá nesse chão e só então você morrerá. O próximo será no joelho direito. Fale! UM...
            - Piedade! Por Deus...Piedade...
            - DOIS...
            - Eu falo, está bem, eu falo. É uma fábrica de móveis. Escolhemos porque tinha muito granito. É no número 124, na primeira entrada após a avenida principal. Agora dê-me atendimento médico, por favor.
            - Que acha, Henrique? Devo ser boazinha, com ele?
            - É, ele merece um médico.
            - Ok. Dê o alerta. Para o FBI e para Nohan. Vou retomar a comunicação com Peter e encontrá-los. Sabe qual a sua sorte, James? É ser inglês. O embaixador de seu país aqui em New York irá visitá-lo no hospital e lhe oferecerá um acordo. Se o seu depoimento sobre essa noite for exatamente como nós desejamos, logo estará em seu país.

            Depois daquele susto, James estava disposta a qualquer acordo para sair dos EUA e ficar longe de Carter. E daquela mulher. Ele a considerava louca.
            Thomas Carter estava nervoso. Quando a ligação com James foi cortada, conseguiu ouvir apenas ‘é ela’. Ele só podia estar se referindo a Rachel, mulher de Caffrey. Ela tinha pego seu parceiro mais fiel e, muito provavelmente, ele já estava morto àquela hora. Isso não era grave, a menos que ele tenha aberto a boca e dito o endereço. E aquela interrogação o vinha desesperando. Verificou as câmeras de segurança da rua. Viu homens do FBI olhando por janelas e entrando sorrateiramente para revistar os lugares. Logo estariam ali e iriam pegá-lo.

            - Inferno! Sua mulher tem uma tendência a me irritar, Neal!
            - É, a mim também. – Ele sorria. – Ela está aí? Finalmente. Já estava espantado com a demora.
            - Cale a boca! – Ele pegou a arma e fez um disparo contra Neal.

            Para se salvar, Neal protegeu-se atrás de sua única alternativa, a estátua de pedra. E viu-a ser destruída pela bala. Ficou triste. Apesar de tudo, era um trabalho seu ainda inacabado sendo depredado.

            - Mas melhor ela do que eu. – Ainda alegrava-se em estar vivo.
           
            O estrondo do tiro alertaria os policiais e logo estariam li, Carter sabia. Então juntou algumas coisas em uma mochila e saiu pelos fundos. Sua aposentadoria graças as peças de Neal Caffrey teria de esperar.

            - Você ainda saberá de mim, Neal.



            Neal ficou sozinho e começou a tentar abrir as grades. Queria tentar seguir Carter. O FBI ia deixá-lo escapar! Não conseguia de modo algum. Com as ferramentas de que dispunha, abrir a fechadura seria impossível. Serrar as grades ainda mais. Tentava então soltar os parafusos que uniam as barras de ferro. Forçou terrivelmente e nada conseguiu. Até que a porta foi arrombada por policiais e logo Peter entrou com Diana.

            - Chegaram atrasados. Ele saiu pelos fundos. – Neal informou-os.
            - Equipe siga para a rua de trás. Suspeito em fuga ao norte! – Diana deu o comando e seguiu nas buscas enquanto Peter ficou para tentar soltar Neal.
            - Onde está Rachel? – Ele estranhou ela não estar ali.
            - A caminho. Estava perseguindo, James. – Tinham lhe informado que ele estava vivo, apesar de parecer um queijo suíço de tão furado. E Peter estava com raiva por ela não obedecê-lo. – Está vendo algo com que possa abrir essa fechadura?
            - Pega aquela faca de ponta e me dá.

            Neal trabalhava há alguns minutos na fechadura da cela quando Rachel chegou carregando um chaveiro. As chaves estavam com James e ela trouxe.

            - Nós dois sabemos o quando é capaz apenas com uma faca, querido. Mas se quiser...
            - Como sempre, Senhora Caffrey, você facilita e deixa meus dias muito mais agradáveis.

            Antes mesmo de abrir a fechadura Rachel aproximou-se e exigiu um beijo. Foi assim mesmo, um de cada lado das grades. E foi bom. Porque tinha gosto de alívio. De vê-lo vivo. De saber que teria aqueles lábios e aquelas mãos em seu corpo para sempre. De repente as barras de ferro a separá-los pareceram geladas demais em contraste com suas peles incandescentes.

            - É bom saber que sentiu minha falta, amor. – Neal lhe disse.
            - Não pense que foi só por amá-lo.
            - A não? E quais os outros motivos?
            - Egoísmo. – Quando ele fez uma expressão estranha ela respondeu. – Descobri que é impossível ser feliz longe de você. Então prepare-se porque querendo ou não vai passar a vida comigo. Nem que eu tenha de te manter numa dessas celas.
            - Não vai precisar. Eu não vou a lugar algum. Acho que o seu egoísmo é um bom motivo, também.
            - Além disso, nem pense que irá embora me deixando com dois filhos pra criar. Não mesmo, Sr. Caffrey. Exijo sua presença conosco.
            - OK, Sra. Caffrey.
            - Que droga, Neal! Eu te amo tanto! E eu passei as últimas horas em desespero sem saber se estava bem.

            Eles retornaram ao beijo. Dessa vez usando um pouco mais as mãos. Rachel ainda tinha a desculpa de conferir se ele estava machucado. Neal não. Então quando suas palmas encontraram o traseiro da esposa sem muita delicadeza, Peter achou que bastava da cena de reencontro. Eles que procurassem um quarto.

            - Abra logo essa cela, Rachel!
  

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