domingo, 8 de junho de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo 45





Quando Neal saiu lhe atirando um beijo e dizendo que voltava logo trazendo a manga que tanto desejava, Rachel correu para o banheiro para vestir um hobby e pentear os cabelos. Não estranhou quando ouviu a batida na porta. Era Jones que veio lhe fazer companhia enquanto Neal estava fora.
Abriu a porta sem pensar e se deparou com Harabo segurando Jones com um braço em seu pescoço e a arma apontada para a cabeça. Os pensamentos de Rachel rapidamente tomaram forma. Ela estava no terceiro andar, June não ouviria nada porque estava no térreo e a arma de Harabo tinha silenciador. Neal ainda levaria no mínimo meia hora para chegar. George dormia no cômodo ao lado, ela não tinha nenhuma arma a mão e Harabo estava completamente louco.

- Como devo chamá-la? Agente Turner ou cadelinha do FBI? – Ele olhava para sua tornozeleira.
- Eu poderia dizer que foi um desprazer de rever, Harabo. Mas ao menos você parou com os recadinhos idiotas. O que quer de mim?
- Ora, ora, ora...nem uns tempos na cadeia fazem você perder a pose. Vamos ver se eu não faço você me respeitar. Mas isso são assuntos particulares. Vamos resolver à sós. – Com um empurrão ele joga Jones no chão, mantendo-o na mira da arma.
- Nem pense em tentar nada, agentezinho! Mexa-se e eu atiro! Vamos Turner!
- Eu não vou a lugar nenhum com você! – Rachel respondeu. – Deixe-o. Ele não tem nada com isso. É a mim que você quer, Harabo.
- É. Isso é verdade. Ele não me serve pra nada. – Ele disse com um sorriso sarcástico no rosto.
Jones percebeu o completo descontrole de Harabo. Sabia que ia morrer. Então tentou atacar na esperança de conseguir se livrar naquele maníaco. Jogou-se contra Harabo e tentou lhe arrancar arma.

- Seu demente! – Jones gritou tentando lhe dar uma rasteira.

Não conseguiu mais do que fazê-lo dar um passo para trás e levar algumas coisas que estavam sobre a mesa ao chão. Sem nenhum aviso Harabo disparou a arma duas vezes seguidas. Os dois tiros acertaram o centro do peito de Jones.

– Pronto! Eu não precisava dele mesmo. – Disse completamente alucinado.

Apesar de toda a competência de Jones, não havia sido páreo para a loucura de ódio de Harabo. Ele não era um criminoso qualquer. Era um fanático sem nenhum sentimento, ética ou responsabilidade.

- Desgraçado! – Rachel disse.
            - Agora você vai largar o celular no chão e colocar essa máscara no rosto, e nós vamos sair daqui, calmamente.
            - Eu não vou com você para lugar nenhum! – Ela repetiu. Se saísse com ele estaria perdida.
            - Vai...e sabe porque, Rachel? Você vai comigo e bem quietinha porque eu tenho essa arma bem carregada e não me custa nada gastar uma bala no bebê de olhos azuis que está aqui nessa casa.
            - Não toque no meu filho!
            - Também posso esperar o seu ladrãozinho voltar e meter uma bala bem no meio da testa dele. – Ele esperou apenas um segundo. – Coloque a máscara agora!

            Sem poder enxergar nada, ela sentiu quando ele puxou suas mãos às costas e algemou. A essa altura, Rachel só torcia para George não chorar e Neal não chegar. Louco como estava, Harabo realmente poderia matá-los a qualquer instante. Lentamente foi guiada escada a baixo. Sentia a arma tocando-lhe a lateral da cabeça. Harabo não dizia nada.
            Rachel soube que estava na rua quando sentiu o ar fresco lhe tocar a pele e arma se afastar de sua cabeça para encostar na barriga. Ele sabia....sabia de Lis.

            - Vadias feito você não deviam se reproduzir, Rachel. Não deviam. – Ele lhe puxou os cabelos. – Você vai entrar num carro agora e nós vamos dar um passeio. Se der um grito que seja, garanto que corto a sua garganta na hora.





A apreensão, o grito de angústia preso na garganta, a sensação de impotência frente a algo sem precedentes. Seu apartamento havia sido palco de um assassinato, sua mulher havia sido sequestrada e tudo que os policiais conseguiam lhe falar era que teve sorte de encontrar seu filho vivo. Sorte? Essa palavra já havia lhe virado as costas há algum tempo.

- Neal... – June lhe chamou. – Me desculpe. Eu não ouvi nada.
- Eu sei June. Não foi sua culpa.
- Temos que ter fé. Ela já saiu de muita coisa ruim antes.

A casa de June estava cheia de policiais. Além da Colarinho Branco e da MI5 que já procuravam por Harabo, a divisão de Homicídios estava ali.

- O corpo do Jones foi levado para a central e será liberado para a família em algumas horas. – Peter lhe disse. – Ele já me tirou um agente, Neal. Nós vamos garantir que Rachel não seja a próxima.
- Ótimo! Agora me diga como! – Neal estava completamente descontrolado.
- Começando com você mantendo a cabeça no lugar! – Peter entendia como ele estava se sentindo. Mas precisava que Neal usasse sua habitual competência ou realmente não teriam nenhuma chance. – Se ele quisesse uma execução, teria feito aqui e fugido. Se a levou, é porque Rachel está viva. Então nós vamos lutar!

A primeira atitude do FBI foi buscar pelo sinal da tornozeleira. Ninguém acreditava que Harabo poderia ter deixado isso passar, mas precisavam começar por algum lugar. Também estavam buscando os registros de câmeras de segurança da região. Com Neal sem estrutura emocional e Mozzie entrando e saindo de casa falando ao telefone, Elizabeth e June cuidavam de George. Ou tentavam. Com mais de 10 meses o menino percebia o ambiente ruim e sentia a falta da mãe. George passou aquela madrugada entre acordado e em um sono tumultuado. Agora choramingava e pedia por carinho.

- Neal...Neal querido... -  Ele não respondia e June chamava tentando manter a própria angústia presa dentro do peito. – Neal...você me ouve?
- O que é?!?!? – Gritou. – Desculpe June...eu não quis gritar com você. Me perdoe...
- Meu menino, não precisa se desculpar. – Ela segurava George firmemente. – Ell está preparando uma mamadeira, acha que ele se sentirá melhor...mas eu acho que George precisa de você agora. E você precisa dele.
- Pa! Pa! Pa! – George ainda não sabia dizer ‘papai’, mas ele tentava enquanto esticava os braços à procura de um abraço.
- Vem filho. Papai pega você. – Sem muita firmeza Neal o segurou e levou para a sacada. Foram ter uma conversa de pai e filho. – A mamãe está longe, filho, o papai não sabe onde ela está. Mas nós vamos descobrir. Eu, o tio Peter, o tio Mozz...a gente não vai parar antes de encontrar a mamãe. E ela é durona. Você sabe! É a nossa garota! Ela não vai se deixar vencer fácil. Ela e a Lis estão bem, seja onde for. A mamãe vai lutar, vai vencer e vai voltar pra nós. Ela sempre consegue. Ela vai voltar pra nós. Vai sim.

Peter estava destroçado. Um homem de sua equipe estava morto. E sentia medo, muito medo pela vida de Rachel. Só de pensar na criança sentia um calafrio. Chegava a se questionar se não tinha cometido um erro fatal ao não enviá-la de volta ao presídio assim que soube da gravidez. Ao menos o bebê estaria a salvo.
Esse caso tinha duas peculiaridades. A primeira era que Harabo não estava movido por nada racional. Simplesmente queria vingança e só o fato de não ter matado Rachel assim que esteve a sua frente já era um indicativo de que ele tinha seu plano muito bem armado. A segunda era que simplesmente não podia contar com a esperteza de Neal Caffrey. Seu consultor havia perdido o foco, perdido o chão e apenas andava em círculos pelo apartamento. Não podia contar com ele.
Então recorreu a segunda melhor pessoa para lhe ajudar a imaginar o que Harabo pretendia.
- Mozz! Vem cá! – Não queria falar na frente de Neal. – Eu sei que você andou fazendo investigações.
- Eu não nego nem confirmo nada antes de saber suas intenções, Engravatado.
- Pare, Mozzie. Não é hora para brincadeiras nem para segredos. Você tem imunidade total nesse momento. – Dizer isso para Mozz era um risco tremendo, mas Peter estava disposto a corrê-lo. – Viu o estado de Neal?
- Claro. – Mozz olhou o amigo discretamente. – Ele não está assim só por Rachel.
- É pela filha. – Tinha que ser. Qualquer homem estaria em desespero.
- Não, Peter. Olhe para ele. Não te lembra nada? Quando Neal ficou dessa forma antes?

Vendo Neal segurar George mesmo com as mãos tremendo, Peter lembrou exatamente do que Mozzie se referia. Só o tinha visto assim uma vez. Quando aquele avião explodiu levando Kate embora, após ele lutar por tanto tempo para tê-la novamente.

- Ele está revivendo tudo. Ele procurou por Kate tendo a fé de reencontrá-la. E ela terminou morta! Neal está em pânico por medo de a história se repetir e, mais uma vez, a família dele se perder.

- Eu preciso da sua ajuda, Mozz. Eu sei que você investigou Harabo. Me traga qualquer coisa que tenha encontrado. Qualquer pista. – Implorou Peter.

Não era sem razão que Mozz passou as últimas duas horas entre várias ligações. Tinha uma rede de contatos, uns amigos e outros nem tanto, capazes de captar em uma espécie de radar do crime. A rede estava em alerta e o radar pronto para captar qualquer sinal de Joseph Harabo.
- Eu ainda não tenho nada concreto para falar. Mas terei...em breve. – Respondeu a Peter.
- Ótimo. E Mozz...traga a nós as suas informações, não ao Neal. Ele não está em condições de iniciar uma caçada ao Harabo. Ele faz bobagens quando está assim.

Quando a casa encheu-se ainda mais, Peter não soube o que fazer. Não podia lidar com o nervosismo de Nicolle e do Richard. O médico amigo da família que veio à cidade para atender Rachel resolveu agora ficar e se colocou a disposição para ajudar. Não tendo tempo nem disposição para nada a não ser lidar com a investigação, pediu que June levasse a todos para o primeiro andar e os mantivesse por lá o máximo que pudesse. Uma babá já estava lá olhando Sophia e Teddy. A missão de Ell era ficar atenta a Neal. Apoiá-lo, sim, mas, principalmente, evitar que fizesse qualquer bobagem.
Tinha uma missão, no entanto, que só ele podia cumprir. E ela se impôs na hora em que Henrique e Shepherd entraram no apartamento.

- Eu sinto pelo seu homem, Peter. Jones foi um agente que honrou o distintivo. – Shepherd disse ao lhe estender a mão. – Meus sentimentos a equipe e a família.
- Eu agradeço, Shepherd. Mas precisamos manter o foco agora em Rachel.
- Alguma notícia? – Henrique perguntou. Estava visivelmente abalado.
- Tivemos algumas pistas, mas não temos um local para fazer buscas.
- Confio em Turner! – Shepherd falou dura e firmemente. – Se há alguém capaz de sair dessa situação ilesa, é ela. Conheço a agente que eu e John treinamos. Ela não se deixará derrubar. Lutará com Harabo e tem chances de vencê-lo. Já o derrotou anteriormente.

Peter sentiu que não podia mais esconder informações. Teriam que trabalhar em equipe.

- Só que dessa vez Rachel não deve tentar lutar com Harabo, Shepherd. E eu não acho que ela vá fazer isso. Ela está grávida de cinco meses.
- Mas... -  Shepherd foi pego em completa surpresa. – Ela não disse nada.
- É uma longa história. Eu também não fui informado quando deveria. Mas agora o que importa é que nós precisamos concentrar nossos esforços ao máximo. Rachel e sua filha precisam de nós. Ao trabalho!

Com a certeza de que nesse caso a MI5 o ajudaria e contando com as informações que Mozzie conseguiria, Peter reuniu-se com Diana. Muito abalada e raivosa pela morte de Jones, colega com quem trabalhou por vários anos, Diana se esmerava em fazer um trabalho ainda mais meticuloso do que sempre realiza.

- Uma câmera registrou essa van preta saindo em alta velocidade numa avenida próxima a da casa de Neal.
- Mas não há garantias de que seja esse o carro? – Peter farejava uma evidência mais forte. – E a tornozeleira?
- Aí é que está, chefe! O sinal da tornozeleira foi disparado quando ela saiu do raio, mas seguiu funcionando após ser jogada em uma lixeira de rua. Rua pela qual esse carro passou. Tudo indica que Rachel, Harabo e mais alguém estavam nessa van.
- Vamos apostar nisso então. Consiga a placa e vamos descobrir para que região da cidade foram.
- A placa já tenho! – Respondeu Diana.
- Ótimo! Vamos caçar esse desgraçado. E Diana, me faça dois favores: trabalhe em parceria com Mozz e mantenha detalhes longe de Neal.
- Claro. Ele está fora de si.


Rachel não sabia onde estava. Até tentou registrar cada curva que o carro fez com ela vendada e algemada lá dentro, mas foram tantas que acabou por perder a noção de espaço. Em certo momento sentiu um soco estourar em seu maxilar.

- Ficou bem quieta com essa coleira no pé, hem! Acha que sou idiota?!?!? – Harabo gritou enquanto puxava sua perna para cima e arrancava a tornozeleira.

Ela percebeu uma breve parada na qual, provavelmente, Harabo livrou-se do rastreador. Rachel a todo o momento pensava em arriscar algo. Qualquer coisa que o fizesse lhe tirar ao menos a venda. Lhe devolvesse minimamente a igualdade em uma luta. Mas não podia se expor. Não tendo Lis ali com ela. Então ficou calada e se manteve a mercê das loucuras de seu sequestrador.

Já amanhecia quando Diana levou a Peter, Henrique, Shepherd e Mozz uma novidade importante. Ela se aproveitou do momento em que Neal tentava fazer George dormir para passar a informação.

- Conseguimos essa imagem do motorista da Van. Foi feita quando ele parou em um semáforo localizado já a mais de duas horas daqui. Eles rodaram bastante. A imagem está granulada, mas bate com os registros desse homem. – Agora ela mostrava uma foto em boa qualidade. – Michel Newman. Fixa policial comum, pequenos crimes.
- Alguma possível ligação com Harabo? – Shepherd questionou.
- Nenhuma. Newman é peixe pequeno e não há indícios de ter participado de crimes fora dos EUA.

Computadores trabalhavam sem parar na busca por informações. Precisavam descobrir onde Michael Newman esteve recentemente e talvez isso lhes desse uma pista de onde estariam. Neal, que até o momento esteve perdido no próprio sofrimento ou dando atenção a George, agora se juntava a eles e exigia participar. Logo bradou que era o mais interessado e tinha o direito de participar do que fosse feito na busca por sua mulher.

- O nome Michael Newman te diz algo? – Shepherd questionou com a precisão de sempre.
- Não, porque? – Neal respondeu.
- Por que aparentemente é ele a dirigir a van na qual Harabo sequestrou Rachel. Estamos tentando descobrir algo mais.

Um instante depois Mozzie desligou o celular. Não disse nem pretendia dizer quem lhe ajudou a conseguir a informação, mas recebeu duas ou três dicas de codinomes usados pro Newman em seus golpes e, com a ajuda de uma fonte muito melhor do que qualquer agente da inteligência do FBI, descobriu o rastro das ultimas atividades financeiras dele.

- Ele alugou três casas, cada uma usando um nome diferente, segundo os cartões de crédito com que pagou. Uma ainda em Nova York, as demais já depois da fronteira.
- A primeira servirá de cativeiro, as outras usará na fuga. – Peter concluiu. – Como teve acesso tão rápido ao sigilo bancário de ‘pessoas’ que nem existem?
- Tenho fontes seguras. Pode confiar. – Não diria mais nada. – Podem não existir, mas Newman alugou casas usando contas bancárias com seus nomes.

Enquanto Diana já pesquisava os endereços, Peter e Shepherd montavam uma estratégia de ação. Não poderiam cometer nenhum erro. Queriam acreditar que Rachel ainda vivia, mas sabiam que se Harabo percebesse qualquer aproximação, colocaria fim nela instantaneamente. Teria que ser uma ação precisa e discreta.

- Teremos um problema. – Diana destacou. – Não é uma casa que funciona desse endereço. É uma fábrica desativada. Tem três andares. Trabalharam com aço lá por três décadas. Só que o lugar hoje é abandonado e não há vizinhos. Dificilmente nossa chegada passaria despercebida.
- Então teremos de ser discretos. Vamos?! O que estamos esperando? – Neal questionou.

Todos se olharam. E concordaram que não havia a possibilidade de Neal participar da ação.

- Você não vai, Neal. Nem pensar! – Peter decretou.
- Como não?!?! É claro que eu vou. June e Ell ficam com George e...
- Seu filho precisa de você aqui. – Foi a resposta categórica de Peter. – Eu vou. E eu farei tudo o que puder, com o máximo de esforço. Confie em nós, Neal. Vamos encontrá-la.
- Eu não posso ficar aqui, Peter.
- Pode e vai! – Ele recorreu a Shepherd. – A MI5 vai controlar a operação daqui. Vou deixar um para ficar de olho em você, Neal. Por favor, não o faça te dar voz de prisão!
- Isso é um absurdo!
- Eu preciso de tranquilidade para fazer meu trabalho e isso não inclui você sumindo armado como já fez na tentativa de conseguir vingança. Confie na minha equipe, Neal. Harabo já me custou um agente, não vou permitir que leve outra integrante da minha equipe.

Ouvir Peter se referir a Rachel como uma integrante da equipe era algo importante para Neal. Ele daria a vida por seus agentes. Faria tudo o que pudesse. Mesmo a contragosto Neal aceitou ficar na base, mas exigiria se manter informado.
Diana, Henrique, Peter, Shepherd e outros três homens seguiram em direção ao endereço. Mozzie não perguntou nada, mas quando todos vestiam seus coletes a prova de balas, simplesmente entrou na sala, vestiu uma das proteções e depois se juntou a eles em um dos carros.

- Ok, Mozz, você tem autorização para nos acompanhar. – Peter disse.
- Eu não perguntei nada, Engravatado. – A frase poderia soar como brincadeira, mas não era. – Menino George não pode ficar sem a mãe...estou fazendo a minha parte.
- Obrigado, Mozz.


Rachel não soube o que a fez apagar ainda no carro. Não sabia quanto tempo passou em viagem nem como chegou naquele lugar. Mas acordou sem grandes dores no corpo, podendo ver claramente e com a mãos livres. Só o latejar no queixo lhe afirmava que tudo era real, não um terrível pesadelo. Olhou em volta. Espaço amplo, máquinas antigas empilhadas próximas a uma parede de tijolos à vista. Ouviu uma porta antiga ranger e logo viu Harabo se aproximar.

- Porque me trouxe para esse lugar? Onde estamos?
- Longe o bastante dos seus parceiros...ou carrascos. Você é crime e polícia ao mesmo tempo, Rachel. É perita em dar rasteiras! Mas agora é fim de linha, Turner.

Automaticamente, ela levou uma das mãos a barriga e acariciou a filha. Estava livre e podia lutar, mas tinha medo de ferir Lis.

- Se vai me matar...porque me trouxe aqui? Pra que matar Jones e me levar?
- Ele eu matei simplesmente porque não faz diferença nenhuma no mundo. É mais um agentezinho. Podia ter matado você lá mesmo. O meu plano era esse. Me aproximar de você e te matar com um ou dois tiros. Nada rápido. Queria te deixar sofrer um pouco. Mas aí eu vi aquela cena linda. Você, o ladrãozinho, uma cria de vocês se arrastando pelo chão e, para coroar a cena, a prova no seu corpo, de que um ser desprezível feito você, num engano da natureza, pode se reproduzir. Deveria ser seca.
- Nós nos odiamos, eu sei. Mas minha filha não tem culpa. – Disse sem saber o que fazer.
- Está vendo essa marca aqui no meu pescoço? Esse nosso encontro é para eu devolver adequadamente. Porque você me esfaqueou, Turner? Vamos relembrar? Porque? Diz!
- Nós lutamos! Você também tinha uma faca. Se eu não o tivesse golpeado, você teria me matado.

Ele riu.

- É. Teria mesmo. E sabe porque? Só pelo gostinho de acabar com você e me livrar da agente chata que vinha me caçando pela morte do papai. Aliás...seu pai já foi uma pedra no sapato. Só que ele deu menos trabalho para morrer do que você. Um atentadozinho só e bateu as botas. Você não!
- Meu pai estava com provas contra você, seu desgraçado! Então você o matou! – O ódio foi tomando conta de Rachel e ela avançou sobre ele.

Conseguiu apenas ser jogada no chão novamente e para proteger Lis abraçou o abdômen.

- Sim, matei! E se soubesse que ganharia você como minha sombra, teria matado os dois na mesma emboscada! E é bom ficar aí mesmo, no chão, antes que eu te arrebente agora mesmo...vou te dar mais alguns minutos de vida. Porque quero relembrar umas coisas com você.

Rachel não queria relembrar nada. Queria apenas que ele abrisse a guarda e ela conseguisse uma brecha para derrubá-lo e escapar. Mas não pode evitar quando ele começou a falar. Foi levada para anos atrás quando teve o confronto com Harabo.




À época, estava no auge de seu preparo físico e psicológico. Em muitos sentidos poderia ser considerada uma atleta. Mantinha seus casos e, paralelamente, cuidava de investigar Harabo. A morte de seu pai seria vingada. Não conseguiu descobrir nenhuma prova de que a emboscada foi armada por ele, mas pode recuperar os arquivos de John e seguiu até que conseguiu um dossiê tão bem amarrado que juiz nenhum seria capaz de negar a prisão.
Sua decepção com a MI5 já era gigantesca. Poucos realmente se lembravam de John. Ele era um agente qualquer. Terminar o que seu pai começou e fazer uso do treinamento que ele havia lhe dado eram as únicas coisas realmente importantes. Suas únicas prioridades na vida eram cumprir a promessa de encontrar o diamante, prender Harabo e provar à MI5 o valor dos Turner.
Fez Harabo de idiota para levá-lo até a emboscada e até forjou algumas provas para piorar sua situação com a justiça. Se dificultasse a prisão, sairia dali morto, não tinha alternativa. E se esse fosse seu destino, ela não ficaria nenhum pouco triste. Chegou a emboscada acompanhada de Henrique, Shepherd e outros dois agentes. Mas ela lideraria a ação. Harabo era seu.
            Exatamente como esperava, ele não se rendeu e ela brincou com seu ego. Era um homem jovem e forte. Ela se ofereceu para uma luta. Ele caiu na provocação.

            - Sou capaz de vencê-lo. Sem armas. Só preciso de meu corpo para te derrubar. – Disse e esperou o resultado sabendo que ele viria.
            - Que seja. UM, DOIS, TRÊS. – Ele contou e ambos jogaram as pistolas longe.

            Ela realmente não se surpreendeu ao  apanhar durante a luta. Ele sim. Nunca imaginou que uma mulher batesse tão forte. Quando sentiu que ia perder, Harabo sacou uma faca da cintura. Também não era novidade. A ‘deslealdade’ era uma característica que John destacou nos relatórios como principais em Joseph Harabo. Só que ela também podia ser desleal e antes dele dar o primeiro golpe, ambos estavam em igualdade.
           
            - Subestimei você, ruivinha. – Ele reconheceu em meio a luta.
            - Cometem esse engano com certa frequência. Uma pena!
            - Agora vou ter de te matar para concertar.
            - Você pode tentar. – Ela havia respondido um instante antes de lhe dar uma rasteira e fazê-lo cair.
            - Vadia! – Gritou Harabo levantando-se e empunhando a faca contra ela. Correu em sua direção e ia cortá-la quando sentiu a navalha lhe rasgar a parte de baixo do maxilar e seguir pescoço abaixo.

            Apagou achando que estava morto. Quando abriu os olhos novamente percebeu que fora pior. Havia sido preso e poderia jamais sair. Além disso, teria que conviver o resto de seus dias com a marca deixada por ela em seu pescoço.

Foi um barulho metálico que tirou Rachel do passado. Harabo estava mexendo nas antigas máquinas enquanto falava. Procurava por algo. Ela não queria saber o que era. Apenas torcia para o FBI estar procurando-a com a mesma ênfase do passado. Agora ela e Lis precisavam deles.

- Então, Turner, achou mesmo que eu ia deixar barato? – Ele falava e mexia nas estruturas de ferro. – Nunca. Só não fugi antes porque você mostrou as garrinhas e traiu a MI5. Adorei saber que esteve enjaulada. Mas agora achei que estava bem demais e que era hora do nosso acerto de contas.

Um barulho forte se fez ouvir quando Harabo puxou parte de uma estrutura metálica. Era similar a uma barra de ferro e o objetivo era claramente usar como arma. Rachel preparou-se para se defender e lutar como podia.

Conseguiu se esquivar do primeiro golpe e tentou revidar com um rasteira. O peso alterado e o centro de equilíbrio afetado com a gravidez lhe prejudicaram e o golpe não surtiu o efeito que no passado ocorreria. Ela caiu. E não demorou a sentir um golpe com a barra lhe atingir a parte de trás das costas, bem na linha da cintura. Por mais que odiasse demonstrar fraqueza, um segundo depois estava caída de joelhos no chão e gritando pela dor.




Peter se aproximava do prédio usando um comunicador no relógio. Conforme ia ganhando terreno e garantindo que não havia ninguém vigiando, avisava a equipe que estava esperando à grande distância. Quando chegou ao prédio viu que o primeiro andar não tinha janelas. Mesmo assim podia ouvir as vozes. Rachel estava lá dentro. Estavam lutando.

- Mande uma ambulância vir e ficar a postos, Diana. Eu vou tentar entrar pelo alto, usando a escada de incêndio dos fundos. Se puder rendê-lo, dou sinal para vocês invadirem.
- Entendido...e chefe...avisaram da central que o Caffrey não está onde deveria.
- Merda! – Disse ele já subindo a escada. – Que seja. Eu já imaginava que ele não ficaria mesmo. Só espero que não faça bobagem.

Pelo terceiro andar Peter conseguiu entrar no prédio com certa facilidade. Fez um rápido conhecimento do lugar e viu que não havia nada além de pó e restos da produção da antiga fábrica. Procurando não fazer barulho algum, começou a descer ao segundo andar.




Bem mais limpo e organizado, mas também com perceptíveis sinais de abandono, não viu nada e se preparou para continuar descendo. Foi quando sentiu a arma ser encostada em seu crânio.

- Vai largar a sua arma e chutar para longe agora. – Disse uma voz que ele não conhecia. Peter foi obrigado a fazer o que ele pediu. – O mesmo com o celular. Agora. – Novamente Peter obedeceu apenas para ver algemas lhe serem estendidas. – Coloque nos pulsos.

Com uma arma encostada em sua cabeça, era mais sensato obedecer. Porém, aproveitou para ligar o comunicador do relógio e falar algo que ajudasse Diana.

- Você deve ser Michael Newman...ok, me pegou. Harabo está lá no térreo com Turner, eu sei. Ele vai se safar, Newman e você vai se ferrar com isso.
- Calado!


Isso foi o aviso para Diana , Shepherd e Henrique. Naquele momento eles se reuniram para decidir o que fazer. Invadir era arriscado, mas não podiam ficar ali parados. O ideal seria manter alguém ali para centralizar as informações e também receber o reforça que se aproxima junto com a ajuda médica.

- O baixinho pode fazer isso! – Disse Henrique.
- Sim, pode....Mozzie! Mozz...- Diana chamou e não teve nenhuma resposta. – Para onde ele foi?
- Acho que sabemos. – Shepherd respondeu. Estava nervoso e cabisbaixo. Sentia-se responsável por Rachel e a cada minuto a sua confiança num final feliz diminuía. Harabo não a deixaria viva. – O que estamos esperando? Vamos!

Enquanto isso, na antiga construção, Michel levou Peter ao encontro de Harabo e Rachel. A cena que ele viu ao descer as escadas foi dolorosa. Sangue pelo chão. Harabo descontrolado caminhando envolta de Rachel e gritando coisas incompreensíveis enquanto, entre as frases, golpeava-a com algo que trazia na mão. Viu quando por três vezes a acertou nas costas e no quadril. Peter não sabia como, mas Rachel mantinha a consciência e viu quando ele se aproximou.

- Encontrei um rato lá em cima. – Disse Newton.
- Ora...ora...- Largando a arma com a qual agredia Rachel, Harabo se aproximou de Peter e pegou a credencial do bolso do paletó. – Peter Burke, FBI. Chegou sua cavalaria, Rachel.

Cruelmente Harabo desferiu um chute na barriga dela. Ele podia estar descontrolado, mas sabia exatamente o que desejava fazer. Matá-la, porém da forma mais dolorosa. Ela estava sangrando muito. Não aguentaria muito tempo.

- Onde estão os outros, Burke? Diga! Estão vindo? – Ele colocou uma arma na cintura e pegou uma mochila que estava pelo chão. E olhou para Rachel no chão. - Não tem problema. Ela está morrendo. Você não poderá fazer nada. Fique aí e assista ela morrer...aliás...eu li que ela matou um agente do FBI. Como era mesmo o nome? A sim...David Siegel. O FBI podia até me agradecer por acabar com ela. Assista a morte dela Burke.

O plano de Harabo era pegar a moto que estava ao lado do prédio e  fugir daqui antes que a polícia o encontrasse. Ninguém sobreviveria naquelas condições. Tinha certeza que Turner logo estaria morta.

- Nós já vamos, Harabo? – Ele ouviu Newman perguntar também pegando sua mochila.
- Desculpe, Michel. Mas peso extra é um problema. – Apenas com um tiro na cabeça matou o comparsa.

Quando viu Harabo sair trancando a pesada porta de ferro, Peter achou que era o fim. Ao longe, ouviu o rugido da moto. Ele estava fugindo. Rachel estava pálida e deitada sobre uma poça feita com seu próprio sangue. Sem assistência médica, morreria logo. Tentando pensar rápido, Peter percebeu que Michel deveria ter algum celular com ele. Com as mãos algemadas a frente do corpo mexeu nos bolsos do morto até encontrar e ligar para Diana.

- Harabo fugiu! Invadam. E ela precisa de assistência médica. Urgente, Diana. Cerque a área! Temos que recapturar esse maníaco. – Peter disse várias ordens ao mesmo tempo.

Sem saber muito o que fazer enquanto isso e apenas verificando o pulso de Rachel ficar mais fraco a cada momento, Peter ouviu a porta ser aberta. Não era Diana. Era Neal. Mas ao longe pode ouvir a ambulância se aproximando.

- Como você sabia para onde vir? – Peter perguntou, mas quando viu Mozz se aproximar entendeu. – Claro. Ele te passou todos nossos passos.

Neal olhava para Rachel, para o sangue e para a barra de metal jogada por perto. Peter sabia exatamente o que ele estava imaginando. Havia visto. E não ia esquecer pelas próximas décadas a cena cruel. Neal tocava-a e sentia que ainda estava viva no exato momento em que os agentes e os paramédicos invadiam o lugar. Pediram para ele se afastar. Foram sumariamente ignorados. Não porque ele desejar atrapalhar, mas por não conseguir sair dalí. Não tinha energia para mais nada.

- Diana...eu vou ficar com Neal. Você está no comando junto com Shepherd. Eu autorizo qualquer coisa. Se precisar falsificar minha assinatura em qualquer formulário, falsifique. Mas encontre Harabo nem que seja no inferno. – Foi a ordem mais ferrenha que Peter já havia dado em toda a sua carreira.

Num estado de completa letargia, Neal acompanhou o resgate. Os médicos não permitiram que ele entrasse na ambulância. Isso dava o tom da gravidade da situação. Os dois foram juntos com Mozz no carro seguindo a ambulância.

- Neal, qual o telefone do médico que atendeu Rachel durante a gravidez? – Peter perguntou.

Ele não respondeu nada. Não se mexia. Não interagia. Estava irreconhecível. Peter e Mozz trocaram um olhar preocupado.

- Eu tenho o número do Dr. Richard. Vou ligar e pedir para nos encontrar no hospital. – Disse Mozzie.
- Ótimo. Ele conhece o estado de saúde dela. Poderá ajudar.

A última imagem que Neal e seus parceiros viram foi a equipe médica levando-a com urgência. Não faziam ideia de quanto tempo esperariam ou o que receberiam de notícia.



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