sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo 21







            Ao contrário do que Peter afirmou, o pesadelo parecia não terminar. Neal passou no hospital e recebeu a informação de que Rachel e Molly estavam realmente bem. Molly foi operada para a retirada da bala que acertou seu ombro direito. Passava bem e ficaria no hospital por alguns dias antes de ir para casa se recuperar. Rachel precisava apenas se recuperar da forte descarga elétrica e estava sendo medicada para dor no quadril devido aos chutes. Ela passaria a noite no hospital e amanhã deveria receber alta.


            Tentou vê-la, mas foi informado de que não poderia. Ela estava algemada à cama e com um guarda na porta. O FBI ainda lembrava da facilidade com que fugiu da outra vez. Para ter notícias dela, conversou discretamente com uma enfermeira.


            - Ela...não disse uma palavra. Está acordada, mas não faz absolutamente nada. Perguntei se estava com dor, se queria que lhe desse outra dose de medicação e ela simplesmente negou com a cabeça.


            Estava preocupado.


            - Que horas acha que ela receberá alta? – Provavelmente no presídio iam lhe permitir vê-la.

            - Estão pressionando a equipe médica. Acho que ainda pela manhã. 


            Queria ficar ali, mas não podia. George continuava inquieto e impaciente. Teria que ir para casa e tentar cuidar do filho. Já fazia horas que ele não se alimentava. O choro poderia ser disso também. Num impulso, anotou seu número de celular e entregou a mulher.


            - Por favor, se algo fora do normal ocorrer, me avise. 


            Na saída do hospital, encontrou Henry. Ele estava angustiado pela esposa. Era possível notar que ele a amava. Preocupado quando viu o bebê chorando, o amigo de Rachel lembrou que tinha um quarto cheio de coisas de bebê em sua casa. Além disso, as poucas coisas que Rachel trouxe estavam lá. Poderiam fazer falta a George que estava cercado agora por pessoas e objetos novos.


            - Acho que eu vou aceitar sim. – Neal disse preocupado com o filho.

          - Ótimo. – Apesar de chateado com tudo o que aconteceu, Henry ainda tinha ânimo e forças para cumprir a promessa que fez a Rachel. Fazer o melhor que pudesse por George. - Me dê seu endereço. Eu passo em casa e levo tudo. O berço eu mando entregarem amanhã, mas no carrinho ele já vai dormir seguro e confortável.

            - Obrigado, Henry. – Cada vez mais Neal reconhecia que ele era uma pessoa leal e a quem Rachel realmente tinha razões para gostar.



            E foi mesmo muito bom ter os objetos que um bebê precisa porque George não facilitou as coisas. Descontente por estar com pessoas que ele não conhecia e ainda agitado com tudo o que presenciou com apenas 4 meses, George não aceitou a mamadeira. Chorava altíssimo como se dissesse em alto e bom som que só se acalmaria quando estivesse com a mãe. Neal e Mozzie já tinham feito mamadeiras com vários tipos e marcas de leite, em pó, engarrafado e até um feito de soja que o pediatra de Theo, filho de Diana, recomendou tentar. Nada.







            - Ele não pode ficar sem comer! – Neal já estava desesperado. Era noite e seu filho não se alimentava de forma alguma. Era teimoso feito a mãe.


            Mozzie, que era bobo por crianças, até conseguiu entretê-lo por alguns minutos com um dos brinquedinhos que vieram na mala que Rachel trouxe na fuga. Também deram banho e colocaram uma roupinha que ele já tinha usado antes. Ajudou. Mas mamar e dormir nem pensar. Os dois estavam exaustos.


            Sem alternativa, Neal ligou para Peter e pediu que ele conseguisse uma autorização para Rachel recebê-lo ainda essa madrugada. Ele iria levar George e ela poderia amamentar. A resposta de Peter foi negativa.


            - Não. Não será possível, Neal. É muito tarde, eu precisaria da autorização de um juiz pra ela receber visita. Se ele estivesse com fome iria aceitar outro leite. Ele não quer.

            - Ele é um bebê, Peter!

            - Eu não posso! – Ele não cedeu.



            Peter ficou tocado com o que houve. Ao fundo ouvia o choro do bebê. Ocorre que simplesmente ia contra as regras. Porém, mesmo que não tivesse ficado tocado, seria obrigado a fazer algo. Elizabeth também havia sido acordada pela ligação de Neal e quando Peter desligou, já estava de pé, vestindo-se.


            - Levante e se vista rápido. – Ordenou ao marido com a cara fechada.

            - Pra que?

            - Nós vamos pra casa de Neal. Ele é nosso amigo e não vamos deixá-lo passar por isso sozinho.



            Assim a casa de Neal estava cheia. Além de Juny, amiga e dona do apartamento onde vivia, Mozzie, Henry, Elizabeth, Peter e Diana, Nicolle também apareceu.


            - Posso pegar meu neto? – Ela perguntou quando chegou.

            - Claro. – Ele aceitaria qualquer um que conseguisse acalmar o menino.



            Neal realmente achava que passaria os próximos dias e noites assim.



            No hospital, Rachel também não dormia. Desde que acordou e se viu ali, presa à cama, soube que seu inferno começara. Uma enfermeira tentou falar com ela. Dizer o que? Que precisa ver seu filho? Saber se estava bem? Não iriam dizer. A mulher veio lhe perguntar se queria remédio pra dor, como se alguns hematomas no corpo chegassem perto do que sentia por dentro.


            Não lembrava porque estava machucada. Também não tinha importância. Era apenas dor. E dor se suportava. Difícil era pensar. Era fechar os olhos e ouvir o choro de George. Sentia o peito inchado, duro de leite que seu filho devia ter mamado. Ele estava com fome. Sabia. Sentia isso. 


            Um choro angustiado veio em sua garganta. Gritou o mais alto que pode, forçou a algema, tentou sair da cama. A mesma enfermeira apareceu.


            - Acalme-se ou terei que sedar você. – Ela disse com voz mansa.

            - Eu tenho que amamentar meu filho. – Disse desesperada.

        - Não há bebê algum aqui. – Foi quando ela viu a marca do leite que vazou e molhou a roupa hospitalar que ela usava. – Vamos colocar compressas. Vai ajudar a não doer conforme o leite secar no seu peito.

            - Eu não quero secar meu leite. Meu filho só tem quatro meses! Ele mama no peito! Eu quero meu filho agora! – Ela gritava feito uma louca na esperança de tocar a enfermeira.

            - Acalme-se eu vou ver o que posso fazer. Não grite mais. Vou ver se existe a possibilidade de tirar o leite e levar até seu filho.

            - Porque não o trazem?

            - Não há autorização para isso. – Era uma verdade dura.



            Quando o celular de Neal tocou e ele conversou com a enfermeira, sentiu um misto de alívio e dor. Alívio em descobrir que havia uma alternativa para acabar com o sofrimento de George, dor em saber que do hospital Rachel também sofria com aquilo. Então era verdade que as mães sabiam quando seus bebês sentiam fome.

            - Impressionante. – Elizabeth comoveu-se quando Neal contou que a enfermeira estava espantada com o desespero da paciente. Ela gritava que o filho precisava mamar.

            Eles tirariam o leite e ele seria trazido até o apartamento. A enfermeira alertou, no entanto, que deveriam tentar intercalar com o leite em pó. Nessa situação era comum o leite da mãe secar no peito.







            Depois que foi informada que seu leite seria dado a George, Rachel se acalmou e permitiu que a enfermeira fizesse a coleta. Ela só não voltou a chorar porque não queria que ninguém presencia-se seu sofrimento.



            Quando o leite chegou, Neal logo percebeu que seus problemas eram muito maiores do que pensava. Tudo era muito difícil. George se assustava com os estranhos na casa, estranhava o ambiente, para pegar o bico da mamadeira foi uma dificuldade imensa.



            - Ele não vai aguentar isso muito tempo. – Peter disse à Ell puxando-a para a varanda.

            - Peter! É filho dele. Está assustado. Ele é muito novinho para tudo o que passou. Pobre criança. Neal tem que ter paciência...e tem...olhe pra ele. Está totalmente dedicado ao filho.


            Nesse momento Neal tentava fazê-lo dormir, mas estava sendo difícil. Perguntava-se como Rachel o ninava. Será que tinha alguma canção em especial? Alguma coisa? Qualquer coisa! Ele só queria saber.


            - Você não tem nenhuma roupa de Rachel? – Nicolle perguntou.


            Neal não entendeu o motivo e nem chegou a respondeu por que Henry se adiantou.


            - Na mala tem coisas dos dois. - Disse ele. – De Rachel e do George.

            - Então pegue uma peça de roupa dela e enrole em George. – A avó do menino disse. – Os bebês lembram do cheiro da mãe. Ele vai se sentir mais seguro, protegido, vai relaxar.


            Por mais incrível que parecesse, ela estava certa. Ele foi enrolado numa blusa branca da mãe e acalmou-se. Neal levou-o para o quarto e ficou pertinho do filho. Sabia que logo ele adormeceria.







            Depois que George estava adormecido e, devido ao seu cansaço, prometia dormir por muitas horas, Neal voltou para a sala. Juny, Henry e Diana já havia ido. Nicolle também estava se despedindo para dar privacidade a Neal naquela primeira noite com o filho. Mozzie iria ficar, provavelmente, para o caso de George precisar de algo. 


            Peter e Elizabeth ainda estavam por lá, mas Neal não queria conversar com Peter. Sua intransigência o estava magoando. Sempre achou que Peter exagerava no cumprimento de regras. Certas ou não, às vezes era necessário deixá-las de lado, abrir uma exceção. Muitas vezes discutiram isso. E ele sempre aceitava que Peter era um homem da lei. Nunca iria mudar. Mas dessa vez essa intransigência fez George sofrer ainda mais. Isso Neal não conseguia aceitar.


            - Ele dormiu. – Era para servir de convite para eles irem embora.

            - Você precisa de mais alguma coisa? – Peter perguntou. Elizabeth estava de pé, pegando a bolsa.

            - Não. O que eu pedi você nem pensou em levar em consideração. Agora só quero dormir, Peter.

          - Neal...eu...- Ele não sabia o que dizer. Quando chegou ali e viu o bebê em prantos, pensou em tentar fazer algo, mas seria realmente muito difícil.

            - Eu não quero falar agora, Peter. Não! Eu só quero dormir. Amanhã cedo a Rachel vai receber alta, vai para o presídio e as coisas vão seguir o curso normal. O bebê vai se acostumar comigo. Eu vou levar ele para ver a mãe. Nós vamos sobreviver a isso.


            Peter ficou em choque.


            - Você vai levar seu filho na prisão? – Era uma loucura.

            - Peter, vamos! – Ell se manifestou. – Isso não é da nossa conta.



            Neal caminhou até a porta e a abriu. A mensagem era clara. Peter e Ell iam saindo quando ele voltou a falar.



            - Quando eu estava preso, Peter, a visita da Kate era o que eu esperava. Era o que me mantinha vivo. – Ele disse. – Não vou tirar isso dela.


            A namorada que teve nos tempos de criminoso, um grande amor, que marcou sua vida e lhe deu forças pra continuar, agora estava morta e era apenas passado. Mas um passado importante na sua história. Seu amigo não disse nada. Apenas Elizabeth despediu-se.


            - Até! – Disse. – Ligue, a qualquer hora, se precisar de qualquer coisa.

            - Obrigado.


            Mozzie ficou na sala e parecia resolvido a fingir que não estava lá. Era bom. Precisava daquele momento de solidão...não...solidão não. Havia um lindo menino ressonando tranquilamente na sua cama, cercado por uma pilha de travesseiros protegendo-o. Era tão lindo, tão perfeito e tão inocente que não merecia estar passando por nada disso.


            Sorrindo, pegou uma sacola de loja de bebê guardada há meses e pegou o móbile que havia comprado. Sabia que um dia George ia usar. Era o primeiro presente que ele ganhou do pai. Esse dia chegou.







            Querendo se aproximar do filho, Neal pegou a mala que Rachel trouxe de Atenas. Ela fez apenas uma bagagem para ela e o filho. Muito mais peças eram de George, mas havia roupas dela, o computador, os cartões de crédito, dinheiro, até um documento falso. Na loucura que foi esse dia, Henry não percebeu que lhe trouxe coisas importantes. Sem pensar, pegou tudo que podia prejudicá-la e escondeu. O FBI não sabia o que ela trouxe. Ia continuar assim.


            Depois continuou mexendo na mala. Separou o que era de George e deixou as coisas dela ali dentro. Não sabia o que ia fazer com aquilo. Ela ia cumprir pena perpétua...dali ia usar no máximo a lingerie. Bom...depois veria isso com ela. Será que Rachel ainda planejava fugir?


            Ficou mexendo nas coisas do bebê. Tudo tão delicado, macio. Olhou as camisetinhas minúsculas. As meias eram mínimas. Havia algumas fraldas, lenços, pomada, talco, xampu e sabonete infantil. Os brinquedos eram molinhos para não machucar. Tudo tão lindo. No fundo da mala viu um papel dobrado. Era a certidão de nascimento de George.




Doeu ver aquilo. Doeu ler a palavra DESCONHECIDO onde deveria haver o seu nome. Iria consertar isso. Registraria seu menino. Ele não ia crescer sem o seu nome nem a sua presença.
 
            Dormiram...muito bem. Até que, às 8hs da manhã, em ponto, George acordou e chamou para o dia os outros ocupantes da casa. Ele chorou, não com o mesmo desespero que na noite anterior, mas deixou claro que preferia ter visto a mãe ao seu lado ao abrir os olhos. Acalmou-se nos braços do pai. 


            Chegou a hora de trocar a fralda. A primeira vez que Neal trocaria uma criança. Ontem Diana fez isso. Ia conseguir! Já tinha pesquisado na internet e sabia exatamente o que fazer! A sequência era simples: tirar a fralda suja, limpar, passar pomada, colocar um talquinho e colocar a fralda nova. Fácil.







            Teria sido fácil...teria...caso George não tivesse esperado para fazer xixi assim que o pai lhe tirou a fralda, molhando Neal e a cama.


            - É...deve ser por isso que usam um trocador. – Disse Neal rindo da situação. – Vamos continuar filho. Não tem problema, depois o pai limpa tudo. O importante é você ficar sequinho e sem assaduras.


            A próxima lição que aprendeu foi: nunca deixar nada perto de um bebê. Para eles tudo era brinquedo. George foi limpo e trocado, mas enquanto isso, a pomada quase foi parar em sua boca e várias fraldas do pacote ficaram espalhadas na cama. O chão também recebeu bastante talco.


            Neal olhava para a bagunça sentindo-se um tanto perdido. Como apenas um bebê conseguia fazer tudo aquilo? Quando olhou para o filho, viu que ele sorria. Pela primeira vez o viu sorrir!


            - Você gostou de fazer bagunça, né? Gostou de sujar o papai? – Fez cócegas em sua barriguinha. George riu ainda mais. – Pode fazer bagunça! Pode!


            Desde que sorrisse assim, não se importava.


            - Exemplo de pai educando o filho. – Mozzie brincou. Na verdade estava achando linda aquela cumplicidade que nascia entre pai e filho. Eles tinham passado tempo demais afastados.



            Peter tinha avisado Neal que ele não precisava ir até o escritório naquele dia. Ele entendeu que seria complicado depois da noite de ontem. Talvez fosse consciência pesada. 


            O fato é que pai e filho passaram a manhã juntos e, felizmente, George aceitou tomar meia mamadeira de leite em pó. Já era alguma coisa. Ainda no hospital, no fim da manhã Rachel tinha tirado mais leite e, a tarde, ele poderia mamar o do peito. Assim iriam intercalando. Teriam de ver como ela faria na prisão.


            Às 14 horas, foi informado por Diana que Rachel estava sendo transferida para o presídio. Poderia receber visitas no fim da tarde. Até desconfiou que Peter não sabia daquela ligação e agradeceu a agora colega de FBI. 


            Desde aquele encontro, num depósito, no início da gravidez, não ficava cara a cara com Rachel. Tinham tantas coisas para falar. Pra conversar, discutir, brigar talvez. As 17h30min estava sentado na sala de visitas da carceragem esperando alguém trazê-la.




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